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Volume 4 Número 1 - Maio de 2012
ISSN: 2177-6571

GEOGRAFIA DA MORTALIDADE NO TRÂNSITO NO BRASIL

GEOGRAPHY OF TRAFFIC FATALITIES IN BRAZIL
28/05/2012

Jorge Tiago Bastos - Universidade de São Paulo / Escola de Engenharia de São Carlos

Antonio Clóvis Pinto Ferraz - Universidade de São Paulo / Escola de Engenharia de São Carlos

Heitor Vieira - Universidade Federal do Rio Grande / Escola de Engenharia

Bárbara Stolte Bezerra - Universidade Estadual Paulista / Faculdade de Engenharia de Bauru

 

Resumo

Nos estudos de segurança no trânsito que envolvem a comparação da acidentalidade em distintos espaços geográficos ou em períodos de tempo diferentes no mesmo espaço geográfico, o índice que relaciona o número de mortes no trânsito à quilometragem percorrida pelos veículos de transporte rodoviário é considerado mais adequado que as taxas que utilizam como referência a população ou a frota de veículos. Neste artigo são apresentados os resultados de pesquisa inédita, na qual foram estimados os valores do índice de mortes em acidentes de trânsito por bilhão de quilômetros percorridos (IMBQ) pela frota de veículos motorizados para o país e para cada estado. A avaliação foi feita com base no número oficial de mortes registradas pelo Ministério da Saúde e na quantidade de combustível vendida informada pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis. Em 2009, o Brasil apresentou um índice de 52,84 mortes por bilhão de quilômetro, o que reflete uma situação extremamente grave considerando ser esse valor entre 7 e 12 vezes maior que nos países mais desenvolvidos. Uma significativa correlação entre o índice de mortes nos estados e o Produto Interno Bruto (PIB) per capita foi observada; em geral, quanto menos desenvolvido economicamente o estado, ou seja, menor o PIB per capita, maior o IMBQ.

Palavras-chave: mortalidade no transito, quilometragem percorrida, indice de mortes.
Abstract

In road safety studies that involve accidents comparisons in distinct geographical spaces or in different periods of time in the same geographical space, the index which lists the number of traffic fatalities with the distance traveled by road transport vehicles is considered more appropriate than the rates related to the population or the fleet. In this paper, the results of an original research are presented, in which the values of the rate of traffic deaths per billion kilometers traveled (IMBQ) by the motor vehicle fleet in Brazil and in each state of the country were estimated. The evaluation was performed based on the official number of fatalities provided by the Ministry of Health and on the amount of fuel sold informed by the National Agency of Petroleum, Natural Gas and Biofuels. In 2009, Brazil presented an index of 52.84 fatalities per billion kilometers, which reveals an extremely alarming situation considering that this value is from 7 to 12 times higher than the one for more developed countries. An important correlation between the death index in the states and the Gross Domestic Product (GDP) per capita was observed; in general, the less economically developed is the state, it means, lowest GDP, higher is the IMBQ.

Keywords: traffic fatalities, distance traveled, death index.

1. Mensuração da mortalidade no trânsito

Nos últimos anos, o Brasil tem experimentado um grande crescimento econômico. Ao final de 2011, o país passou a ocupar a 6ª posição entre as maiores economias do mundo, atingindo um PIB (Produto Interno Bruto) de 4,21 trilhões de reais (BRASIL, 2011a). As transformações resultantes desse processo afetam diretamente a segurança no trânsito, sobretudo devido ao grande aumento da frota de veículos motorizados – que foi de 83,68% entre 2004 e 2008.

Os impactos desse processo são refletidos no padrão crescente e contínuo do número de mortes no trânsito, as quais, segundo dados ainda preliminares, em 2010 totalizaram mais de 40 mil (BRASIL, 2010b). No Brasil, assim como na maioria dos países em desenvolvimento, a situação da segurança é normalmente avaliada por meio de índices de mortes relativos à população e à frota de veículos automotores, ou ainda, com base nos números absolutos. Os índices de mortes por 100 mil habitantes e por 100 mil veículos são, respectivamente, 19,34 e 63,88 para o ano de 2009. Entretanto, sabe-se que o uso dos índices de mortes por habitantes e por veículo pode gerar interpretações inadequadas quando tomados como referência para comparações no âmbito da segurança viária (FERRAZ, RAIA JR. e BEZERRA, 2008; THAGESEN, 1996).

O índice de mortes por habitante mede o impacto negativo da acidentalidade viária na sociedade, pois permite a comparação do risco de morte no trânsito com os riscos advindos de outras causas de morte; informação útil na definição de prioridades nas políticas de saúde pública. No entanto, este índice não é adequado na avaliação do nível de segurança no trânsito, pois países pobres, onde a taxa de motorização é pequena e o investimento em segurança viária baixo, podem apresentar índices menores que os de países desenvolvidos, nos quais a taxa de motorização é grande e o investimento em segurança viária alto.

O índice de mortes por veículo, que mede o risco de morte nas viagens por transporte rodoviário, é mais apropriado que o índice de mortes pela população para avaliação do nível de segurança no trânsito. Contudo, o valor desse índice também pode apresentar significativo viés, pois nos países ricos, com altíssima taxa de motorização, a quilometragem média percorrida pelos veículos é, em geral, menor do que a observada em países menos desenvolvidos, onde a taxa de motorização é consideravelmente menor.

À luz desses fatos, o emprego do índice de mortes em relação à quilometragem percorrida pelos veículos rodoviários é o mais indicado para a avaliação da segurança no trânsito.

Existe alguma dificuldade em estimar com precisão a relação entre exposição e o número de acidentes, visto que essa relação não é linear (ELVIK, ERKE e CHRISTENSEN, 2009; GOLOB, RECKER e ALVAREZ, 2003). O ideal seria o conhecimento da distância percorrida pelas pessoas em cada modo de transporte, além de outras características dessa exposição. O levantamento dessas informações deveria ter abrangência nacional. Contudo, a quilometragem percorrida ainda figura como a informação mais adequada para relativizar os dados de mortes, principalmente quando da impossibilidade de outras informações detalhadas sobre a exposição.

No Brasil, não há a disponibilidade de informações que possibilitem o cálculo direto da intensidade da quilometragem percorrida pelos veículos rodoviários. Em razão disso, o método mais indicado para obter essa informação é a realização de estimativas por meio do consumo de combustível, a exemplo do que fazem alguns países europeus.

 

2. Objetivo da pesquisa

O objetivo da pesquisa foi estimar os índices de mortes em acidentes de trânsito por bilhão de quilômetro percorrido (IMBQ) pela frota de veículos motorizados, no país e em cada estado, nos anos de 2004 a 2009 (último ano em que as informações utilizadas no cálculo estão disponíveis), bem como examinar a evolução deste índice no período 2004-2009. A avaliação foi feita com base no número oficial de mortes registradas pelo Ministério da Saúde e na quantidade de combustível vendida informada pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis, com as adequações consideradas pertinentes.

 

3. Método empregado

A pesquisa compreendeu três etapas: estimativa da quilometragem percorrida com base no consumo de combustível, levantamento de dados de morte e cálculo dos valores do índice de mortes por quilômetro (IMBQ). A estrutura do modelo utilizado é mostrada no fluxograma da Figura 1 .


 

FIGURA 1 – Fluxograma das informações utilizadas no modelo.

3.1. Estimativa da quilometragem percorrida com base no consumo de combustível

Para estimar a quilometragem percorrida com base no consumo de combustível, foram necessários os seguintes dados: frota de veículos motorizados (informação desagregada por tipo de veículo, tipo de combustível usado e estado em que o veículo está registrado); vendas de combustíveis (informação desagregada por tipo de combustível e unidade da federação); e taxa de consumo de combustível (informação que depende do tipo de veículo e do tipo de combustível).

3.1.1. Frota de veículos motorizados

De acordo com dados do Departamento Nacional de Trânsito – DENATRAN, os tipos de veículos estão desagregados em 21 categorias (BRASIL, 2011b). Na pesquisa foram consideradas as categorias mais importantes, tendo sido empregada a seguinte clasificação: automóvel; comercial leve (caminhonete, camioneta e utilitário); caminhão (caminhão e caminhão trator); ônibus (microônibus e ônibus); e motocicleta (motoneta e motocicleta).

A Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores, em trabalho conjunto com o Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores, também disponibiliza dados de frota, porém com informações sobre o número e o tipo de veículos segmentados de forma diferente, discriminando o tipo de combustível e o modelo do veículo (ANFAVEA/SINDIPEÇAS, 2009).

Como cada uma das fontes de frota possui vantagens quanto à forma de organização, optou-se por usar uma base de frota mista. Essa base congrega os números absolutos de veículos apresentados pelo DENATRAN e a distribuição dos tipos de combustíveis de acordo com os percentuais da frota da ANFAVEA/SINDIPEÇAS.

As categorias listadas anteriormente foram redistribuídas conforme segue (cada qual com a distribuição dos tipos de combustíveis conhecida): automóveis, comerciais leves, motocicleta com menos de 115 cilindradas, motocicleta entre 115 e 250 cilindradas, motocicleta entre 250 e 500 cilindradras, motocicleta com mais de 500 cilindradras, caminhão leve, caminhão médio, caminhão pesado, microônibus, ônibus rodoviário e ônibus urbano.

3.1.2 Venda de combustíveis

Os dados sobre venda de combustíveis pelas distribuidoras autorizadas são disponibilizados pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis – ANP  (BRASIL, 2011c).

As vendas de GNV foram obtidas com base em  Gasnet (2010).

Os volumes de álcool e óleo diesel foram corrigidos com a eliminação da parcela de combustível destinada a outras atividades que não o transporte rodoviário motorizado (transporte hidroviário, transporte ferroviário, atividades de agropecuária, etc.). Essa correção não foi necessária para a gasolina e o GNV, pois o valor vendido declarado corresponde exclusivamente ao consumo no transporte rodoviário. 

3.1.3 Taxa de consumo de combustível

A taxa de consumo de combustível é dada pela quantidade de quilômetros percorrida com 1 litro ou 1m3 (no caso do GNV) de combustível. Foi adotado, na pesquisa, a taxa de consumo do veículo representativo de cada subclasse, pois não há grandes variações nessa taxa entre veículos pertencentes à mesma subclasse.

Para os automóveis e comerciais leves, a taxa de consumo foi adotada principalmente com base em testes feitos pelo Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial – INMETRO, realizados para o Programa Brasileiro de Etiquetagem Veicular, sob responsabilidade Programa Nacional de Racionalização do Uso dos Derivados do Petróleo e do Gás Natural – CONPET (BRASIL, 2010c).

As motocicletas tiveram seus dados de consumo provenientes de sítios especializados da internet (MOTOESPORTE, 2010).

Para caminhões e ônibus, as taxas de consumo de combustível foram adotadas iguais às utilizadas pelo Ministério do Meio Ambiente (BRASIL, 2010a).

3.1.4 Estimativa da quilometragem percorrida

O cálculo da distância viajada para cada veículo por tipo de combustível em cada unidade da federação foi feito utilizando a Equação 1:

                                        (1)

em que     Qklmn – Distância viajada pelo veículo da classe “k”, usando    combustível “l”, no ano “m”, na unidade da federação “n” [km];
                   Fjwklmn – Frota do veículo da subclasse “jw”, da classe “k”, usando combustível “l”, no ano “m”, na unidade da federação “n”;
                   Tjwklm – Taxa de consumo do pelo veículo da subclasse “jw”, da classe “k”, usando combustível “l”, no ano “m” [km/l];
                   pjwklmn – Parcela usada pelo veículo da subclasse “jw”, da classe “k”, do combustível “l”, no ano “m”, na unidade da federação “n” [%];
                   Vlmn – Vendas do combustível “l”, no ano “m”, na unidade da federação “n” [l];
                   w – Número de subclasses de veículos, w = 17.

O cálculo da distância viajada usando os diferentes tipos de combustíveis em cada unidade da federação foi realizado empregando a Equação 2:

                                                     (2)

em que     Qlmn – Distância viajada pelos veículos usando o tipo de combustível “l”, no ano “m”, na unidade da federação estado “n” [km];
                   Qkxlmn – Distância viajada pelo veículo da classe “kx”, usando combustível “l”, no ano “m”, na unidade da federação “n” [km];
                   x – Número de classes de veículos, x = 4 (automóvel, motocicleta, caminhão e ônibus).

O cálculo da distância viajada por todos os veículos em cada unidade da federação foi efetuado com o emprego da Equação 3:

                                                  (3)

em que     Qmn – Distância viajada por todos os veículos no ano “m”, na unidade da federação “n” [km];
                   Qlymn – Distância viajada pelos veículos usando o combustível “ly”, no ano “m”, na unidade da federação “n” [km];
                    y – Número de tipos de combustíveis, y = 4.

O cálculo da distância viajada por todos os veículos em todas as unidades da federação foi realizado utilizando a Equação 4:

                                                    (4)

em que     Qm – Distância viajada em todas as unidades da federação, no ano “m” [km];
                   Qmnz – Distância viajada pelos veículos na unidade da federação “nz”, no ano “m” [km];
                    z – Número de unidades da federação, z = 27.

3.2. Número de mortes

Os dados de óbitos são disponibilizados pelo Ministério da Saúde por meio do sistema de informações sobre mortalidade do DATASUS, atualizados até o final de 2009  (BRASIL, 2010b).

Nesse banco de dados, a causa morte é especificada de acordo com a Classificação Internacional de Doenças (CID), sendo que os grupos V01 a V89 correspondem a mortes em razão de acidentes de trânsito. No entanto, devido à ocorrência de alguns tipos de acidentes de transporte não ser determinada pela atividade de transporte rodoviário motorizado, os agrupamentos V01, V05, V06, V10, V11, V15, V16, V17, V81, V82, V83, V84, V85, V86 e V88 foram excluídos da análise.

3.3. Estimativa do índice de mortes por quilômetro percorrido

O valor do índice de mortes por bilhão de quilômetro percorrido em cada unidade da federação foi determinado com base na equação 5:
                                                                                                           (5)
em que     IMmn – Índice de mortes no ano “m”, na unidade da federação “n” [mortes/109km];
                   Mmn – Número de mortes no ano “m”, na unidade da federação “n”;
                   Qmn – Distância viajada no ano “m”, na unidade da federação “n” [km].

Para o cálculo do índice nacional, incluindo todas as unidades da federação, foi utilizada a expressão 6:
                                                                                    (6)
em que     IMm – Índice de mortes nacional no ano “m” [mortes/109km];
                   Mmnz – Número de mortes na unidade da federação “nz”, no ano “m”;
                   Qm – Distância viajada em todas as unidades da federação, no ano “m” [km];
                    z – Número de unidades da federação, z = 27.

 

4. Resultados obtidos e comentários 

Na Figura 2 estão indicados os valores do índice de mortes por bilhão de quilômetro no país, obtidos para os anos de 2004, 2005, 2006, 2007 e 2008, bem como os valores de outros parâmetros relacionados com a mortalidade no trânsito.


FIGURA 2 – Valores do IMBQ e de outros parâmetros no país.

No período de 2004 a 2009, ocorreram, no país, as seguintes variações percentuais dos parâmetros citados: número de mortes = +7,50%; índice de mortes por quilômetro = – 22,59%; índice de mortes por veículo = – 29,01%; índice de mortes por habitante = +0,59%; índice de motorização = +41,65%.

Na análise desagregada por unidade da federação, foram estabelecidos quatro grupos com base nos valores do IMBQ. Na Figura 3 é mostrado o mapa do país com a identificação da classificação de cada estado em relação aos distintos grupos estabelecidos, para os anos de 2004, 2005, 2006, 2007, 2008 e 2009. Na Tabela 2 estão relacionadas as unidades da federação contidas em cada grupo e o intervalo entre os valores extremos de cada índice.

TABELA 2 – Classificação dos estados por grupo com base nos valores do IMBQ.

Grupo 2004 2005 2006 2007 2008 2009
A 45,98-63,67 45,55-64,30 41,24-62,31 38,28-54,52 35,81-51,16 33,11-49,05
SP, RS, DF, MG, AM e SC SP, RS, MG, DF, AM e SC SP, RS, DF, MG, AC e AM SP, RS, AM, DF, MG e RJ SP, RJ, AP, RS, AM e DF SP, RS, AM, DF, RJ e MG
B 65,59-76,00 67,78-81,06 62,38-74,83 57,74-72,56 51,91-63,76 53,72-62,52
BA, RJ, RO, RR, RN, AC e GO RJ, RO, RN, MT, PR, GO e AC SC, GO, RO, RJ, RN, BA e PR RO, SC, RN, GO, AP, AC e MS MG, RN, SC, GO, RO, BA e AC SC, AP, RN, BA, GO, MS e RO
C 81,87-103,47 81,48-100,11 75,66-96,45 74,59-91,45 66,00-84,33 63,54-76,45
MS, MT, PR, ES, AP, PA e PE AP, BA, ES, MS, TO, PA e PE MT, MS, AP, ES, TO, SE e PE PR, BA, MT, TO, ES, PE e PA PR, MS, MT, PE, TO, PA e ES AC, PR, PA, ES, MT, TO e RR
D 104,79-154,11 100,13-162,45 96,92-158,40  93,98-147,89 88,24-146,02 79,05-133,12
PB, TO, SE, MA, CE, AL e PI SE, PB, RR, MA, CE, AL e PI PA, RR, PB, MA, CE, AL e PI PB, SE, CE, RR, MA, AL e PI RR, SE, PB, CE, MA, AL e PI PE, PB, CE, SE, MA, AL e PI

 

A maioria dos estados brasileiros apresentou redução do IMBQ entre 2004 e 2008, apesar de alguns apresentarem oscilações no decorrer desse período. Com base nas informações obtidas, constata-se o melhor desempenho do estado de São Paulo em todos os anos. Em contraste, têm-se os estados de Alagoas e Piauí com os piores índices em todos os períodos.


FIGURA 3 – Identificação do grupo correspondente a cada estado do país.

Na Figura 4, estão relacionados o índice de mortes por quilômetro (com os estados ordenados do menor para o maior índice) e o Produto Interno Bruto – PIB per capita nos respectivos estados  (BRASIL, 2011d).


FIGURA 4 - Relação entre o índice de mortes por quilômetro e o PIB per capita em 2009.

Conforme mostra a Figura 4, existe uma significativa correlação entre o índice de mortes nos estados e o Produto Interno Bruto (PIB) per capita; em geral, quanto menos desenvolvido economicamente o estado, ou seja, menor o PIB per capita, maior o IMBQ. Uma das razões para isso é que os estados menos desenvolvidos investem menos em segurança no trânsito por falta de recursos.

Este fato evidencia a forte relação entre a segurança no trânsito e o nível de desenvolvimento econômico e social de um local, o que remete à teoria da escala de importância das necessidades humanas proposta por Maslow – a preocupação com a segurança no trânsito aparece somente após a satisfação de necessidades mais básicas da população, como habitação, saúde, educação, mobilidade, emprego, etc..

Os valores obtidos para os diversos estados são importantes na definição de prioridades no investimento de recursos (do governo federal ou dos próprios estados) para combater a mortalidade no trânsito.

 

5. Considerações finais

Em 2009 (último ano em que estavam disponíveis as informações), o Brasil apresentou um índice de 52,84 mortes por bilhão de quilômetro, o que reflete uma situação extremamente grave considerando ser este valor entre 7 e 12 vezes maior que nos países desenvolvidos. Na Figura 5, estão indicados os índices de alguns países desenvolvidos, relativos ao ano de 2010, e o índice obtido para o Brasil, relativo ao ano de 2009.  


FIGURA 5 – Comparação entre o IMBQ no Brasil e em outros países.
Fonte: Bastos (2011) - Dados do Brasil para 2009; OECD (2011) - Dados dos demais países para 2010.

Isso mostra que o combate à acidentalidade – sobretudo à mortalidade – no trânsito deve ser colocado como uma das prioridades do país. É preciso investir em educação, fiscalização e punição dos infratores, melhoria da segurança das rodovias e vias urbanas e aperfeiçoamento dos serviços médicos de urgência. A perspectiva para o futuro, se ações concretas e ficazes não forem colocadas em prática, é ainda pior, pois o número de mortos no trânsito vem crescendo sistematicamente nos últimos anos - entre 2004 e 2010, aumentou 16,20% (vale lembrar que as informações para o ano de 2010 são ainda preliminares).

No entanto, a ação mais importante é conscientizar e convencer a sociedade acerca da gravidade do problema e da necessidade de todos (população, políticos, autoridades, técnicos, empresas, etc.) se engajarem no propósito de criar uma cultura de segurança no trânsito no país (algo como um pacto nacional) visando à redução de acidentes, mortes e feridos. Para isso, é preciso realizar campanhas eficazes utilizando todas as formas de mídia e colocar em prática processos eficientes de educação para o trânsito no âmbito escolar, nas empresas, nas organizações sociais, etc.    

O fato é que o país não pode mais continuar tendo, anualmente, mais de 1 milhão de acidentes de trânsito, cerca de 40 mil mortes e cerca de 500 mil feridos (milhares ficando com sequelas graves definitivas). Isto provoca o sofrimento de milhares de pessoas, desestrutura uma quantidade imensa de famílias e custa à sociedade da ordem de 40 bilhões de reais por ano.

A diminuição verificada nos índices de mortes por quilômetro e por veículo nos últimos anos, deve-se mais à redução natural desses índices, associada ao crescimento da taxa de motorização do que à implementação de ações governamentais (sobretudo por parte do governo federal) que, embora de grande relevância, estão longe de compor uma política adequada de segurança no trânsito para o país.

 

Referências

ANFAVEA/SINDIPEÇAS. Frota circulante no período 2004-2009. Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores / Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores. São Paulo. 2009. Planilha cedida pelas instituições.
BASTOS, J. T. Geografia da mortalidade no trânsito. Escola de Engenharia de São Carlos - Universidade de São Paulo. São Carlos, p. 150. 2011. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Transportes).
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FERRAZ, A. C. P.; RAIA JR., A.; BEZERRA, B. S. Segurança no trânsito. São Carlos: Grupo Gráfico São Francisco, 2008.
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THAGESEN, B. Highway and traffic engineering in developing countries. Grã-Bretanha: E & Fn Spon, 1996.

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