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Volume 3 Número 1 - Maio de 2011
ISSN: 2177-6571

ASSIMETRIA DE INFORMAÇÕES E O RISCO DE CAPTURA DE AGÊNCIA REGULADORA

INFORMATION ASYMMETRY AND THE CAPTURE RISK OF REGULATORY AGENCY
24/05/2011

Antonio Sérgio Rodrigues
Agência Nacional de Transportes Terrestres - ANTT

Resumo

Este artigo analisa o fenômeno da assimetria de informações existente entre as agências reguladoras e os entes regulados, de forma teórica e sua comprovação na prática, procurando avaliar como o contexto de informações assimétricas contribui para os riscos de captura das agências reguladoras pelo próprio agente regulado, com embasamento do Direito Administrativo e Regulatório. Por meio de um levantamento da literatura especializada, faz-se uma revisão dos conceitos da teoria econômica relativos às imperfeições de mercado, assimetria de informações e suas relações com a atividade regulatória. Trata das principais teorias de captura das agências sob a ótica da assimetria de informações e discute alguns aspectos técnicos que podem levar à sua captura por parte, principalmente, do ente regulado. Finalmente, embasado em uma pesquisa de opinião com Especialistas em Regulação, busca levantar o grau de importância, as características, dimensões significativas e causas da assimetria de informações existentes entre as agências reguladoras e os entes regulados, de forma a verificar sua correlação com os riscos de captura das próprias agencias pelas empresas reguladas prestadoras de serviço público.

Palavras-chave: regulacao, assimetria de informacoes, risco de captura.
Abstract

This article examines the phenomenon of asymmetric information among the regulators agencies and the regulated entities, in theory and practice, trying to evaluate how the context of asymmetric information contributes to the risk of capture of regulators by the regulated agent, based on Administrative and Regulatory Law. Through a survey of the literature, a revision of the concepts of economic theory concerning market imperfections, asymmetric information and their relationship with regulatory activity is done. It  approaches the main agencies capture theories from the perspective of asymmetric information and discusses some technical aspects that can lead to their capture by, mainly, the regulated entity. Finally, based on a poll of experts on regulation, it seeks to define the level of importance, characteristics, significant dimensions and causes of asymmetry of information among the regulators and the regulated entities in order to check its correlation with the risk of capture of their own agencies by regulated companies providing public services.

Keywords: regulation, asymmetry of information, risk of capture.

1 - INTRODUÇÃO

As agências reguladoras, na visão da mais moderna Doutrina, principalmente de Carvalho Filho (2008, p.558), são entidades autárquicas especiais, criadas pelo Governo, dentro do processo de modernização do Estado, com o objetivo institucional de controlar as pessoas responsáveis pela prestação de serviços públicos, sob a forma de concessão, permissão e autorização, além de intervir no domínio econômico, quando necessário, para se evitar abusos dos entes regulados provenientes da iniciativa privada.

Criadas por leis específicas, as agências reguladoras detêm prerrogativas especiais que as habilitam a administrar interesses do governo, empresários e usuários, grupos antagônicos que lutam para fazerem prevalecer suas posições no mercado, no cenário estabelecido pelo modelo de Estado regulador decorrente do Plano Nacional de Desestatização – PND, que transferiu “à iniciativa privada o que o Estado exercia de forma dispendiosa e indevida.”, segundo Carvalho Filho (2008, p.559)

Várias são as dificuldades enfrentadas por esses órgãos reguladores na busca de garantir a prestação do serviço adequado, conforme preconiza o artigo 6º da Lei 8987/1995 e os contratos de concessão estabelecidos com as firmas reguladas prestadoras do serviço público. Dentre elas, destaca-se a assimetria de informações existente entre esses agentes econômicos, em favor do ente regulado.

Nesse contexto de informações assimétricas, foi desenvolvida a chamada “teoria da captura”, originária dos Estados Unidos da América, que segundo Justen Filho (2002, p. 369-370), ocorre quando a agência perde sua condição de autoridade comprometida com a realização do interesse coletivo e passa a reproduzir atos destinados a legitimar a consecução de interesses privados dos segmentos regulados.

A assimetria de informações, identificada pela teoria econômica como uma imperfeição de mercado, facilita os comportamentos oportunistas dos entes regulados na defesa de seus interesses e dificulta a atuação dos órgãos reguladores no cumprimento de suas competências institucionais.

Com esse foco e sob o amparo dos desenvolvimentos teóricos sobre o tema, foi realizada pelo autor uma pesquisa de opinião junto a Especialistas em Regulação, com o objetivo de verificar a correlação entre a assimetria de informações existente e o risco de captura das agências pelas empresas reguladas prestadoras de serviço público.

 

2 - ASSIMETRIA DE INFORMAÇÕES E REGULAÇÃO DE MERCADO

Vivemos em uma sociedade extremamente dependente de informações para a tomada de decisões em qualquer campo da atividade humana, haja vista a rapidez nas mudanças tecnológicas, nas alterações dos costumes e práticas sociais. É cristalino nos dias de hoje, na visão de Lima (2005, p.2), que:

A sociedade atual vive profundas mudanças nos modos de produção e de reprodução das suas relações, configurando uma formação histórica que tem sido denominada sociedade da informação. Esta nova formação traz consigo imensas possibilidades e desafios, incluindo a redução das desigualdades sociais e econômicas.

No contexto da chamada sociedade da informação, ocorre a assimetria de informações quando dois ou mais agentes econômicos estabelecem entre si uma transação econômica com uma das partes envolvidas detendo informações qualitativa ou quantitativamente superiores às da outra parte.

Segundo Santa Rosa (2008, p.64), no âmbito da teoria econômica, um dos principais argumentos para a intervenção do Estado nas relações entre os agentes econômicos é a existência das imperfeições de mercado, com destaque para a assimetria de informações, tida como das mais importantes motivações para a ação reguladora estatal.

2.1 A Assimetria de Informações e o Mercado

Faz-se necessária uma breve discussão sobre o conceito de mercado, bem como das chamadas imperfeições de mercado, tal como se apresentam na literatura econômica, com o objetivo de se compreender a assimetria de informações como uma imperfeição de mercado, o que será feito a seguir, baseado na visão de Teixeira (2001, p 1-12).

Mercado é uma palavra muito usada nos dias de hoje, porém, carece de uma conceituação mais precisa. Do latim mercatus, significava originalmente o espaço público onde as pessoas compravam os gêneros alimentícios. Na Idade Média o termo preservou seu significado original, onde na França, por exemplo, o marché era um abrigo ventilado e coberto, geralmente construído em madeira, onde se dava a venda de alimentos.

Posteriormente, com o desenvolvimento do comércio, todas as grandes cidades mercantis da Europa possuíam mercados especializados para diferentes produtos: tecidos, couro, trigo, carne, vinho etc. Mesmo no Brasil ainda restam algumas dessas construções, não só no Rio e em Salvador, como em Belém e Manaus, cujos mercados, construídos durante a fase de expansão do ciclo da borracha, guardam a memória de uma época de luxo e fausto na região.

Os economistas utilizaram a palavra mercado para designar, sem distinção, uma determinada forma de organização social, na chamada economia de mercado, em que teoricamente deveria predominar a livre formação dos preços, ou designar o movimento agregado de oferta e procura de bens, ou mesmo com referência a determinados produtos específicos.

Segundo Teixeira (2001, p.2), Cournot, precursor da aplicação da linguagem matemática à Economia, disse em 1838 que:

Os economistas entendem por mercado não um lugar determinado onde se consumam as compras e as vendas, mas toda uma região em que compradores e vendedores se mantêm em tal livre intercâmbio uns com os outros que os preços das mesmas mercadorias tendem a nivelar-se fácil e prontamente” (COURNOT, A.A., Recherches sur les Principes Mathématiques de la Théorie dês Richesses).

A evolução do conceito de mercado, segundo o pensamento de autores pertencentes às Escolas Clássica e Neoclássica, foi observada por Teixeira (2001, passim), conforme as citações seguintes.

Adam Smith pressupõe a sua “mão invisível”, que atua através da concorrência, mas, para ele, mercado e concorrência são dados que prescindem de maiores explicações.

Joan Robinson, em 1953, apresentou uma definição de mercado como “a demanda por um grupo de mercadorias que são substitutas próximas entre si.”

Jevons entende “por mercado ... o mesmo que os homens de negócio quando empregam o termo”, ou seja “duas ou mais pessoas que negociam dois ou mais bens, e cujas intenções de troca e de estoque desses bens são do conhecimento de todos” e antecipa a discussão sobre estrutura dos mercados: “um mercado é teoricamente perfeito apenas quando todos os comerciantes têm perfeito conhecimento das condições de oferta e procura, e da relação de troca conseqüente; e em qualquer momento nesse mercado ... poderá haver apenas uma relação de troca de um bem homogêneo”.

Sem ampliar muito a definição desses conceitos, Walras (TEIXEIRA, 2001 apud, Walras, p.34), chega a conclusões semelhantes, sem conhecer previamente Jevons, ao dizer:

“As coisas valiosas e permutáveis chamam-se também mercadorias. O mercado é o lugar onde se trocam as mercadorias. O fenômeno do valor de troca produz-se, pois, no mercado e é ao mercado que se deve ir para estudar o valor de troca (...) O valor de troca abandonado a si mesmo produz-se naturalmente no mercado, sob o império da concorrência”(grifos no original).

Diante dessa conceituação, para o estudo da assimetria de informações existente no mercado, há que se ressaltar a complexidade das questões relativas à teoria do equilíbrio dos mercados, considerada na visão do respeitável economista brasileiro Mário Henrique Simonsen, segundo a afirmativa:

Essa teoria não passa de uma abstração e que o mundo real não passa de uma sucessão de desequilíbrios. O que há a lembrar é que as dificuldades para teorizar sobre esse mundo real são consideráveis, pois se faz necessário saber: (a) como os agentes econômicos se decidem em face da incerteza (...); (b) como os erros de previsão no passado afetam as previsões para o futuro” (TEIXEIRA, 2001, apud SIMONSEN, p.9) (grifo nosso)

2.2 Imperfeição de Mercado e Assimetria de Informações

Uma falha de mercado (ou imperfeição) ocorre quando os mecanismos de mercado, não regulados pelo Estado e deixados livremente ao seu próprio funcionamento, originam resultados econômicos não eficientes ou indesejáveis do ponto de vista social.

Marshall, segundo Teixeira (2001, p.8), que foi responsável pela idéia inicial de estruturas de mercado, sugeriu a existência de tipos diferenciados entre a concorrência perfeita e o monopólio – os casos de oligopólio, da concorrência monopolista e das associações monopolistas – que seriam posteriormente definidos pelos economistas.

As imperfeições (ou falhas) de mercado, porém, não se limitam aos casos de monopólio ou oligopólio, e outras situações vêm sendo estudadas, tais como: a indivisibilidade do produto, custos de transação elevados, externalidades, riscos e incertezas na oferta de bens e assimetria de informações entre os agentes econômicos, que são na verdade os fundamentos para a intervenção do Estado na economia ou para a regulação do mercado pelo Estado.

Segundo Fiani (2002, passim) a partir do artigo “A Natureza da Firma” de Ronald Coase em 1937, a teoria econômica passou a considerar significativos os custos de transação quando comparados com os custos de produção, únicos considerados importantes até então.

Custos de transação, portanto, são custos relativos ao processo de aquisição e venda de um produto, ou seja, associados às transações econômicas. São custos de negociar, redigir e garantir o cumprimento de um contrato, que os agentes enfrentam toda vez que recorrem ao mercado.

Cabe considerar ainda, que os custos para se firmar um contrato se tornam insignificantes quando o comprador e o vendedor conhecem todas as características relevantes do produto transacionado, ou seja, existe entre eles uma simetria de informações.

A teoria dos custos de transação elimina a hipótese de simetria de informações e elabora um conjunto de hipóteses que tornam os custos de transação significativos, que envolve a racionalidade humana limitada diante de um ambiente negocial complexo e incerto, com margem à atuação oportunista dos agentes envolvidos.

Assim, Fiani (2002, p.270) conceitua assimetria de informações:

Racionalidade limitada, complexidade e incerteza têm como consequência gerarem assimetrias de informação. Assimetrias de informação nada mais são do que diferenças nas informações que as partes envolvidas em uma transação possuem, particularmente quando essa diferença afeta o resultado final da transação.

2.3 Problemas Gerados pela Assimetria de Informações

A informação é um elemento primordial no âmbito das relações econômicas. As empresas tomam suas decisões estratégicas com o objetivo de manter e ampliar suas participações no mercado a partir de informações internas delas próprias e das externas, relativas aos seus competidores e parceiros no mercado.

Ocorre que as empresas operando em um ambiente altamente competitivo ocultam as informações relativas à sua estrutura de custos, pesquisa e desenvolvimento, capacidade financeira e aquelas que possam influenciar as estratégias de seus concorrentes.

No ambiente regulatório, as Agências Reguladoras, com o objetivo forçar a prestação do serviço público adequado de forma eficiente, necessitam de informações detalhadas a respeito das atividades econômico-financeiras das firmas reguladas, que são obtidas diretamente destas ou de forma indireta por meio de pesquisas e análises de mercado.

Nesse contexto, considerando a forma de atuação das empresas em seus comportamentos estratégicos e os mecanismos onerosos para a obtenção de informações relevantes por parte dos órgãos reguladores, “tem sido observado um aumento da assimetria de informações, ampliando, por sua vez a complexidade da atividade regulatória” Pinto Jr & Pires (2000, p.2).

O referido autor enfatiza, ainda, que:

A introdução da informação assimétrica na teoria econômica tem trazido novos insights de como as chamadas falhas de mercado podem ser enfrentadas através de mecanismos externos ao mercado, visando o aumento de bem-estar da coletividade. Uma das conseqüências mais relevantes da existência de informação assimétrica, principalmente numa relação contratual, é a presença de comportamentos oportunistas entre os agentes, por parte daqueles que possuem mais informações. Os principais problemas decorrentes da informação assimétrica já desenvolvidos pela teoria são a seleção adversa e o risco moral. Pinto Jr & Pires (2000, p.5) (Grifos meus)

A teoria econômica reconhece a seleção adversa como um comportamento oportunista ex-ante, isto é, ocorre antes da efetivação da transação entre os agentes econômicos, decorrente do custo de acesso a informação por parte do agente consumidor. Um exemplo de oportunismo ex-ante pode ser a contratação de uma empresa fornecedora de um produto ou serviço, cujas especificações ela tenha conhecimento antecipado de que não possui expertise para produzir.

A seleção adversa, portanto, decorre de comportamentos oportunistas originados da assimetria de informações ao nível pré-contratual, e para evitá-la é necessário encontrar mecanismos que possam reduzir as assimetrias existentes. Segundo Pinto Jr & Pires (2000, p.5) a teoria institucionalista de Williamson define dois mecanismos principais de diminuição de assimetrias visando amenizar o oportunismo pré-contratual, que seriam a sinalização e a varredura.

A sinalização (signaling) se refere à emissão de sinais e fornecimento de informações por parte do agente que a detém, ou seja, o agente que está recebendo a informação deve confiar na sinalização do outro agente.

Na varredura (screening) a parte interessada fornece incentivos para a revelação da informação assimétrica pelos agentes que possuem a informação desejada (os que desejam informações fornecem incentivos de modo a atrair apenas aqueles que as possuem).

A teoria econômica reconhece também o risco moral (moral hazard) como um comportamento oportunista, decorrente de informações assimétricas entre agentes econômicos, porém ex-post, isto é, ocorre posteriormente ao estabelecimento de contrato entre as partes ou devido a um comportamento imprevisto durante a sua execução.

Segundo Fiani (2002, p.271), o risco moral ocorre, por exemplo, quando há problemas na execução de uma transação contratada por uma empresa fornecedora de um insumo a um preço fixo, a qual, de forma oportunista, reduz o nível de qualidade na entrega para reduzir seus custos.

Embora ocorra durante a execução do contrato, a informação assimétrica que dá origem ao risco moral não é referente a características não conhecidas dos agentes, mas a um comportamento oportunista desconhecido pelo outro agente, quando se firma a relação contratual.

A teoria institucionalista de Williamson, segundo Pinto Jr & Pires (2000, p.6), defende o estabelecimento dos seguintes mecanismos com uma possível solução compensatória frente ao risco moral:

1º - Monitoração – espécie de auditoria independente ou monitoramento das condições de execução do contrato, o que torna possível a percepção de comportamentos inapropriados mesmo antes de eles ocorrerem;

2º - Cláusulas de incentivo - mecanismos contratuais que buscam incentivar os comportamentos positivos, ou seja, realizar a convergência entre os comportamentos dos agentes econômicos (alinhamento de incentivos) visando eliminar o risco moral e;

3º - Joint-ventures – posse compartilhada dos ativos que estabelece algum grau de integração entre as partes com a finalidade de reduzir o risco do comportamento oportunista dos agentes.

2.4 Dimensões de Assimetria de Informações

Diante de conceituação teórica desenvolvida e considerando que a principal causa dos problemas regulatórios é assimetria de informações, ressaltam-se duas dimensões básicas de assimetria de informações existente entre a agência e o ente regulado, conforme Cabeza & Cal (2008, p. 11) a seguir.

A dimensão exógena da assimetria de informações, denominada de “seleção adversa”, é decorrente do fato do regulador não possuir o mesmo nível de informações que o regulado em relação a fatores exógenos que afetam a eficiência da concessionária do serviço, ou seja, parâmetros tecnológicos, comportamento da demanda, dentre outros.

A dimensão endógena da assimetria de informações, conhecida como “risco moral”, é decorrente do fato de somente o regulado possuir o conhecimento do resultado de determinados movimentos intrinsecamente endógenos, como os custos, os resultados de medidas administrativas, entre outros, o que possibilita a manipulação do esforço pelas concessionárias do serviço, objetivando vantagens na revisão dos contratos ou na estipulação de metas regulatórias.

2.5 Assimetria de Informações e a Teoria do Principal-Agente

A teoria econômica do principal-agente analisa alguns tipos de relações hierárquicas entre indivíduos, grupos de indivíduos ou organismos, que estabelecem relações econômicas de fornecimento e consumo de mercadorias e serviços, com possibilidades de se ter comportamentos oportunistas de agentes econômicos em decorrência da existência de assimetria de informações entre as partes.

A relação principal-agente acontece entre paciente e médico, segurado e seguradora, dono de terra e meeiro, patroa e empregada doméstica, eleitor e eleito, passageiro e taxista. A relação principal-agente é mutuamente vantajosa se puder ser estruturada de forma a contornar os problemas inerentes a este intercâmbio. Em geral, existe um contrato entre as partes, que determina qual a tarefa e como vai ser a remuneração. Este contrato pode ser tanto um contrato formal por escrito e com validade jurídica, como um contrato tácito. (LIMA, 2005)

Nessa relação, encontrando espaço, o agente pode agir de forma oportunista em função das características do negócio, da atuação do principal, mas principalmente por deter informações que são do seu conhecimento exclusivo ou que seja muito oneroso ao principal o acesso a tais informações no mercado.

Por outro lado, na fase de negociação, as partes têm a alternativa de estabelecerem um contrato que possa alinhar incentivos para ambos os lados, de modo a contornar os problemas de informação e mitigar o risco de comportamento oportunista por parte do agente, ou seja, atuar preventivamente para se evitar uma grave assimetria de informações no futuro.

De qualquer forma, os problemas de informação incidem de maneira diferente dependendo da especificidade da relação entre os agentes econômicos e, segundo Lima (2005, p.10).

Existem duas classes gerais de solução para o problema principal-agente. A primeira envolve uma forma de remuneração estruturada de forma a alinhar os incentivos de ambas as partes. A segunda classe de soluções para o problema principal-agente envolve o surgimento de regras e instituições que tenham o efeito de evitar o comportamento oportunista do agente e alinhar os interesses de ambas as partes.(Grifo meu).

 

3. ASSIMETRIA DE INFORMAÇÕES ENTRE AS AGÊNCIAS REGULADORAS E OS ENTES REGULADOS

A assimetria de informações possibilita a atuação oportunista entre agentes econômicos, decorrente da imperfeição de mercado no processo de obtenção, utilização e atualização de informações técnicas e mercadológicas necessárias à formulação e/ou à execução do contrato entre as partes.

Diante dessa realidade de mercado expressada pela teoria econômica e o contexto regulatório, pode-se considerar a teoria principal-agente, desenvolvida no título anterior, na visão de Lima (2005, p. 10), como a aplicação mais comum à regulação que envolve a agência reguladora e o ente regulado.

A agência é vista como o principal que delega ao agente, a tarefa de produzir o serviço de utilidade pública. O interesse da agência é que a empresa atenda toda a demanda em um nível satisfatório de preço e qualidade. O interesse da empresa é maximizar seu lucro. A regulação possui todas as características de um problema principal-agente. Sendo assim, pode-se esperar que ambos os lados busquem estruturar sua relação de modo a contornar os problemas de informação e oportunismo.(LIMA, 2005).

Outros autores, como Cabeza & Cal (2008, p. 17), sustentam que “a abordagem da teoria principal-agente está relacionada às questões relativas à assimetria de informações” mas também “quanto àquelas relacionadas aos direitos de propriedade”, que envolvem o relacionamento entre a agência reguladora (principal) e a firma regulada (agente).

A teoria econômica assegura, também, que a assimetria de informações entre o regulador e o regulado ocorre em favor do regulado. O regulador para exercer uma regulação eficiente e garantir a prestação do serviço público adequado, com tarifas módicas em um cenário empresarial competitivo, deve possuir uma base de informações técnicas e mercadológicas de boa qualidade.

“Entretanto”, segundo Pires & Pinto Jr (2000, p. 8), a obtenção das informações ocorre mediante custos: quanto maior for a assimetria de informações entre os agentes mais custoso será o processo de acesso às informações relevantes e, conseqüentemente, mais custosa será a regulação para o agente regulador setorial.

Como vimos anteriormente, a firma regulada atua de forma defensiva no mercado competitivo e dificulta a ação da agência reguladora na constituição de uma base de dados e informações referentes ao negócio, que é essencial para balizar o nível da intervenção regulatória em defesa do usuário sem riscos significativos de inviabilizar a prestação do serviço, além de estimular a firma regulada a operar de forma eficiente.

3.1 Pesquisa de Opinião com Especialistas em Regulação

Com o objetivo de levantar o grau de importância, as características, dimensões significativas e causas da assimetria de informações existentes entre as agências reguladoras e os entes regulados, de forma a verificar sua correlação com os riscos de captura das próprias agências pelas empresas reguladas prestadoras de serviço público, foi feita pelo autor, no período de julho a agosto de 2010, uma pesquisa de opinião junto a Especialistas em Regulação ativos nas agências reguladoras federais e estaduais.

Assim, utilizando-se de uma amostragem por conveniência, foi enviado um questionário, por e-mail, para 277 Especialistas em Regulação de seis agências reguladoras federais e uma estadual, com o recebimento de trinta e nove respostas (14%), cujos resultados são apresentados paulatinamente nas seções seguintes.

3.2 Grau de Assimetria de Informações

A visão dos Especialistas em Regulação, entrevistados por e-mail, relativa à importância do tema assimetria de informações entre a agência reguladora e a entidade regulada, de uma forma geral, ao responderem à questão: “Qual o grau de assimetria de informações existente entre a agência reguladora que você trabalha e o(s) agente(s) regulado(s)? (Elevado; significativo, moderado ou baixo)", está resumida quantitativamente na Tabela 1.

Tabela 1 – Participação dos Especialistas em Regulação na Pesquisa

Fonte: Pesquisa de opinião com Especialistas em Regulação – Julho/Agosto de 2010

3.3 Dimensão Mais Significativa da Assimetria de Informações

A teoria desenvolvida anteriormente mostra que a assimetria de informações entre a agência e o regulado pode possuir dimensão exógena ou endógena. A visão dos Especialistas em Regulação, entrevistados por e-mail, embasada pela conceituação teórica, quando questionados pela Questão 2 ... “Na sua agência, qual seria a dimensão mais significativa”...Exógena ou Endógena?, está resumida quantitativamente na Tabela 2.

Tabela 2 - Participação dos Especialistas em Regulação na Pesquisa

Fonte: Pesquisa de opinião com Especialistas em Regulação – Julho/Agosto de 2010

3.4 Causas de Assimetrias de Informações

Ao se analisar as teorias que buscam explicar os problemas causados pela assimetria de informações, notadamente entre a agência reguladora e o agente regulado, pode-se inferir um sem número de hipóteses causais para esse fenômeno mercadológico. Afastando-se desse exercício teórico que pouco acrescentaria ao tema em estudo, resumimos na Tabela 3 as setenta e quatro causas assinaladas pelos 39 Especialistas em Regulação da referida Pesquisa de Opinião, de forma condensada em sete grupos causais específicos, classificando-os do maior para os de menor incidência, segundo a visão dos Especialistas.

Tabela 3 - Participação dos Especialistas em Regulação na Pesquisa

Fonte: Pesquisa de opinião com Especialistas em Regulação – Julho/Agosto de 2010

O artigoIntrodução aos Problemas da Qualidade da Informação nos Atos Fiscalizatórios das Agência Reguladoras, de autoria de Especialistas em Regulação  da ANTAQ (Lins & Trevas & Cintra), apresentado no V Congresso Brasileiro de Regulação em 2007, faz  uma abordagem diagnóstica simplificada sobre os sistemas de informações da agências, identifica informações exógenas e endógenas aos processo de fiscalização e apresenta sugestões para um aprofundamento no tema visando assegurar bases de informações confiáveis para os atos fiscalizatórios.

Nesse contexto, os autores citam dois aspectos causais da assimetria de informações entre as agências e o setor regulado, que são:

  •     a atrofia sobre o conhecimento especializado pela saída do agente público da operação do sistema propriamente dito e pela ausência de documentação histórica sobre o segmento.
  •     a dicotomia da formação do quadro de pessoal, que convive com antigos técnicos profissionais altamente qualificados provenientes do Estado provedor, hoje já desatualizados tecnologicamente, e profissionais com formação acadêmica especializada, recrutados por concurso público, que não dispõem de uma aprendizagem prática dos sistemas operativos.

Assim, destaca-se um problema grave de assimetria de informações onde, na visão dos autores ...“o agente regulador passa a depender das informações dos agentes regulados, que poderão cercear o conhecimento oferecendo informações imperfeitas, ou seja, não claras e/ou não corretas e/ou não completas e/ou não coerentes e/ou concisas.”

Concluindo, o referido artigo apresenta quatro sugestões interessantes para discussões sobre o tema, se não vejamos:

  •     Ampliação do conhecimento acadêmico em Engenharia de Sistemas para os agentes reguladores;
  •     Treinamento dos agentes reguladores em técnicas de convivência em ambigüidade de informações;
  •     Treinamento dos agentes reguladores em técnicas de convivência com a simbiose existente entre o excesso de informações e a completeza devida;
  •     Participação contínua junto aos demais agentes de fiscalização em suas respectivas áreas de competência.

 

4 A ASSIMETRIA DE INFORMAÇÕES E O RISCO DE CAPTURA DE AGÊNCIA REGULADORA

Captura regulatória ocorre quando uma agência estatal reguladora, criada para defender o interesse público, atua em favor dos interesses comerciais ou especiais que dominam a indústria ou setor sob regulação. Captura regulatória representa, portanto, uma falha de governo, pois ele próprio pode agir como um incentivo para as grandes empresas que produzem externalidades negativas.

No contexto de informações assimétricas entre a agência reguladora e a empresa regulada, surge, segundo Carvalho Filho (2008, 460) o que a doutrina denominou de “teoria da captura” (“capture theory”, na doutrina americana) que busca impedir que o órgão regulador perca sua capacidade de decidir em favor do interesse da sociedade na prestação dos serviço público adequado e passe a produzir atos regulamentares e de gestão em favor de interesses privados dos segmentos regulados.

A teoria da captura regulatória é defendida por economistas críticos das conceituações de intervenção regulatória do governo como sendo motivados para proteger o bem público, sendo Bernstein (1955) o mais destacado, e está associada com o economista ganhador do prêmio Nobel George J. Stigler, um dos seus principais desenvolvedores, pertencentes ambos à chamada Escola de Economia de Chicago.

4.1 Ciclo de Existência das Agências Reguladoras

Fernanda de A. Pirotta, em seu excelente artigo “O fenômeno da captura nas agências reguladoras”, (2006, passim), relata que a teoria da captura vincula-se, em particular, ao pensamento de Bernstein, o qual destacou a ocorrência de um ciclo de existência das agências, aceita pela Escola de Chicago. A citada autora resume o tema com maestria, conforme a seguir:

De acordo com esta teoria, os primeiros tempos de vida de uma agência caracterizam-se pela grande disposição e energia para cumprir os fins de interesse coletivo. Na fase de maturidade do órgão regulador, os integrantes da entidade iriam perdendo sua capacidade de controlar os segmentos sob sua fiscalização. Com o passar do tempo, a agência começa a depender de informações fornecidas pelos controlados, os quais adquirem papel cada vez mais relevante na determinação de representatividade dos interesses geridos pelas agências. Os interesses da comunidade são dispersos, difusos; já os entes controlados organizam-se e atuam de modo sistemático para influenciar as decisões da agência. Depois de decorrido certo interregno, a própria memória da atuação regulativa transfere-se da agência para os setores regulados. Não é incomum que apenas as indústrias reguladas disponham de informações acerca de atos e decisões anteriores adotados pela agência. Na fase de velhice, as agências dependem diretamentedos controlados, configurando-se uma espécie de acordo colusivo entre eles.(grifos meus)

Por outro lado, a Escola de Chicago é criticada por outros autores, segundo Fréderic Boehm (2005, 247), porque não considera a informação assimétrica e somente contempla o lado da oferta da indústria, sem sinalizar o lado de demanda do agente regulador. É interessante notar que a teoria do principal-agente, tratada anteriormente, permite explicar a discrição do regulador, a verdadeira fonte das rendas monopolísticas e o porquê as empresas têm poder de influenciar o regulador.

Há que se considerar, também, que o Ciclo de Existência das Agências é uma conceituação teórica que retrata um fenômeno inerente ao modelo da agência, em função da permanente interlocução com entidades reguladas, mas que na prática sofre gradações segundo fatores relativos à sua criação, ao seu modelo de gestão e em relação aos demais riscos de captura existentes.

4.2 Riscos de Captura de Agência Reguladora

Ampliando-se a abrangência das possibilidades da captura, segundo Frédéric Boehm (2005,247), ela pode ser diferenciada mediante três critérios:

Critério nº 1 - Segundo o ator ativo: O regulador pode ser capturado pela indústria ou pelos políticos. A captura por políticos é o exemplo clássico de abuso das empresas públicas no uso indevido da política para defender interesses pessoais;

Critério nº 2 - Segundo o tempo transcorrido entre uma captura ex ante e uma captura ex post. Na captura ex ante, a regulação ainda não existe e se tenta capturar o poder legislativo para influenciar no desenho das instituições reguladoras. Na captura ex post, a regulação já está vigente e se tenta capturar o poder executivo;

Critério nº 3 - Há diferenças entre uma captura legal e uma captura oculta através de corrupção. A captura não tem por si só uma conotação de ilegalidade. No entanto, a captura do regulador pode incluir a corrupção e as atividades legais dentro do sistema político, o que se conhece como lobby.

Pode-se verificar, portanto, um vasto leque de possibilidades de captura de agências, sendo focado neste artigo o Critério nº. 1, onde o regulador pode ser capturado pela regulado, no contexto de assimetria de informações existentes entre eles, originada dos dispositivos adotados na relação contratual (contrato de concessão) e decorrentes das necessidades de gestão contratual para a prestação do serviço adequado.

4.3 Riscos Significativos de Captura Existentes nas Agências

Conforme a literatura, as agências reguladoras convivem com riscos de captura de diversas naturezas. Na visão dos Especialistas em Regulação, ao responderem à questão “Cite em ordem de prioridade quais seriam os três riscos mais significativos de captura existente hoje para a Agência que você trabalha?” da pesquisa de opinião, resultaram 110 (cento e dez) situações de riscos de captura, que foram agrupados em: riscos políticos, da própria agência, devido ao regulado, ao servidor, à assimetria de informações e outros, cujos resultados foram apresentados na Tabela 4.

Tabela 4 - Participação dos Especialistas em Regulação na Pesquisa

Fonte: Pesquisa de opinião com Especialistas em Regulação – Julho/Agosto de 2010

Cabe ressaltar que, dentro do foco do tema sob estudo, esta questão aberta que gerou 110 (cento e dez) respostas, sendo que 10 (dez) delas relataram situações de risco de captura por assimetria de informações, transcritas a seguir, que representou 9% das indicações dos Especialistas.

  •     A falta de ação efetiva para, entre outras coisas, capturar informações primárias sobre os agentes de mercado.
  •     Captura regulatória (incapacidade de obtenção de informações por parte das empresas reguladas).
  •     Risco de captura pelo baixo conhecimento sobre assuntos relacionados ao ente regulado (estrutura de custos, mercado atendido pela Concessionária, etc).
  •     Sentir inibição frente ao baixo conhecimento técnico.
  •     Risco de captura tecnológica.
  •     Risco de captura relacionada a custos de implantação.
  •     Risco relacionado à demanda.
  •     Assimetria de informações (internas).
  •     Ausência de estudos feitos por organismos de reputação ilibada.
  •     Incapacidade de ação por falta de conhecimento.

4.4 Correlação entre Assimetria de Informações e o Risco de Captura

Autores diversos discutem as questões relativas ao processo de obtenção de informações necessárias à agência para executar a regulação e suas relações com a possibilidade da captura da própria agência reguladora pelo ente regulado, detentor de grande parte dessas informações. Na visão de Santa Rosa (2008,63):

Para Oliveira(1998) “Independentemente de problemas éticos, verificou-se elevada propensão dos “regulados capturarem os reguladores” em virtude de insuficiência de recursos e informação adequada por parte da agência comparativamente às empresas privadas e pela identidade de interesses e cultura profissionais entre técnicos especializados da agência e o segmento regulado.

Por outro lado, na visão de PINTO JR & PIRES (2000,p.7), admitindo-se a vigência de um contrato de concessão entre as partes, a relação e o cumprimento dos dispositivos contratuais se enquadram num contexto de informação assimétrica, pois a agência (principal) dispõe de um conjunto imperfeito de informações sobre o regulado (agente). Caso as informações sejam referentes, por exemplo, à estrutura de custos da empresa regulada, é de se esperar que o regulador tenha uma base de conhecimento que dependa da confiabilidade das informações prestadas pelo agente. Neste ponto reside o problema da captura do regulador por parte da firma regulada, uma vez que o primeiro tem que tomar suas decisões baseado nas informações recebidas do último.

Diante desse cenário teórico e como fundamentação prática, apresenta-se a visão dos Especialistas em Regulação obtida por meio da citada Pesquisa de Opinião, quando responderam à questão - Que correlação você faria entre a assimetria de informações existente e o risco de captura de uma Agência Reguladora. (Elevada, significativa, moderada ou baixa), cujas respostas foram estratificadas na Tabela 5.

Tabela 5 - Participação dos Especialistas em Regulação na Pesquisa

Fonte: Pesquisa de opinião com Especialistas em Regulação – Julho/Agosto de 2010

 

5 CONCLUSÃO

Dentro da amostra pesquisada, sem inferir para toda a categoria dos Especialistas em Regulação, o grau de assimetria (Tabela 3) foi considerado significativo (55%), elevado (24%), moderado (16%), baixo (5%) e indefinido (3%), o que demonstra a relevância do tema e a confirmação das considerações teóricas, principalmente quando se verifica na mesma pesquisa que 84% dos Especialistas entendem que a assimetria de informações entre as agências reguladoras e os entes regulados é relativa a apenas seis causas específicas, conforme a seguir:

1ª - Problemas de gestão e/ou falta de planejamento estratégico da agência.

2ª - Falta de conhecimento do negócio do setor e/ou de dados primários do mercado ou sobre os entes regulados.

3ª - Relativas à atuação ou características do agente regulado.

4ª - Quadro de profissionais regulatórios (falta de pessoal, remuneração, evasão, capacitação, desatualização tecnológica em relação aos agentes do ente regulado etc.).

5ª - Inerentes ao modelo/tempo de criação da agência.

6ª - Influência Política.

Cabe ressaltar que os problemas relativos à gestão e/ou falta de planejamento estratégico das agências representam, de uma forma geral, 31% das causas da assimetria superando em 17% a segunda causa mais significativa que foi a falta de conhecimento do negócio do setor e/ou de dados primários do mercado ou sobre os entes regulados (14%), conforme dados da pesquisa – Tabela 3.

Por outro lado, a pesquisa ressaltou a prevalência da dimensão endógena (risco moral) da assimetria de informações (Tabela 2), que representou 55% das indicações dos Especialistas em comparação com 29% da dimensão exógena (seleção adversa), o que enfatiza a necessidade das agências aprofundarem seus esforços para reduzir o comportamento oportunista ex-post dos agentes regulados, adotando, por exemplo, soluções compensatórias tais como a utilização dos mecanismos de monitoramento, contratos de incentivo e joint-ventures conforme a teoria institucionalista de Williamson descrita anteriormente.

Quanto à dimensão exógena (seleção adversa) da assimetria, ainda com percentual relevante de 29%, as agências/ministérios finalísticos poderão adotar preventivamente para os novos contratos dois mecanismos básicos – Sinalização (sinaling) e Varredura (screening) - visando mitigar o oportunismo ex-ant pré-contratual, conforme sugere o renomado autor.

Os riscos significativos de captura existentes nas agências reguladoras, segundo a visão dos Especialistas pesquisados (Tabela 5), apresentam a seguinte gradação de importância quanto à origem: política (31%), do agente regulado (27%), da própria agência (21%), decorrente da assimetria de informações (9%), dos próprios servidores (6%) e referentes a outros fatores (6%), econfirma o critério nº 1 de Frédéric Boehm que "O regulador pode ser capturado pela indústria ou pelos políticos”“, conforme citado neste artigo.

Apesar de os riscos de captura da agência reguladora decorrentes da assimetria de informações com as empresas reguladas serem apenas da ordem de 9% na visão dos Especialistas, a pesquisa identifica, Tabela 5, uma correlação elevada em 38% e significativa em 26%, entre a assimetria de informações e o risco de captura, o que vem confirmar a citada visão de Santa Rosa apud Oliveira (1998) de que é elevada a propensão dos regulados capturarem os reguladores em virtude da insuficiência de recursos e informação adequada por parte da agência, comparativamente aos entes regulados.

Diante do exposto, apesar das limitações técnicas na aplicação e análise da pesquisa de opinião, tais como:

  •     realização por meio de uma amostragem de conveniência para envio de e-mails aos Especialistas em regulação, sem a possibilidade de escolher uma amostra dentro das exigências científicas do processo  estatístico;
  •     participação de apenas 39 Especialista em Regulação, de oito agências reguladoras federais e uma estadual;
  •     falta de estratificação da pesquisa por área técnica específica de regulação; e
  •     utilização de uma metodologia simplificada para análise

Conclui-se que foram alcançados resultados relevantes para demonstrar a importância do estudo da assimetria de informações, existentes entre as agências reguladoras e as empresas reguladas, como uma das causas de captura dos órgãos reguladores pelos próprios agentes regulados.

Esse tema precisa ser estudado exaustivamente pelas agências reguladoras, segundo as características próprias de cada uma, de forma a se estabelecer ou mesmo rever os planejamentos estratégicos existentes e aprimorar as estruturas de regulação e fiscalização, no sentido de minimizar os riscos de captura, melhor conhecer as características do mercado regulado, se aproximar dos usuários dos serviços e da sociedade de uma forma geral, conhecendo-lhes as necessidades e anseios, com o objetivo maior de prestar o serviço adequado segundo os ditames estabelecidos pela Lei das Concessões 8987/95 em sintonia com a Constituição Federal.

Não se pode admitir como natural a possibilidade da agência reguladora, autarquia especial criada para garantir a prestação do serviço público adequado por meio dos concessionários, permissionários e autorizatários, venha perder a sua condição de autoridade comprometida com a realização do interesse coletivo e passe a reproduzir atos destinados a legitimar a consecução de interesses privados dos segmentos regulados.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CARVALHO FILHO, José dos Santos. – Manual de Direito Administrativo, Lumens Juris, RJ, 20ª Ed., 2008.

JUSTEN FILHO, Marçal. – O Direito das Agências Reguladoras Independentes, Dialética, SP, 2002.

SUNDFELD, Carlos Ari. (coord.) – Direito Administrativo Econômico, Malheiros, SP, 2002.

LIMA, Clovis Ricardo M. – Assimetria de Informações e Regulação de Mercado. Disponível em SANTA ROSA, Paulo Morais – Captura de Agências Reguladoras um fenômeno multidimensional, Política Democrática – Revista de Política e Cultura, nº. 20, março 2008.

TEXEIRA, Aloísio – Mercado e Imperfeições de Mercado: O Caso de Assistência Suplementar, do Caderno de Saúde Suplementar n.º 2, junho 2001. Disponível em http://www.ans.gov.br/portal/upload/forum_saude/objeto_regulacao/AA4.pdf, acesso em 2 de abril de 2010.

FIANI, Ronaldo. Teoria dos Custos de Transação, capítulo 12 do livro Economia Industrial – Fundamentos Teóricos e Prática no Brasil, Campus, 2002.

PINTO JR, Helder Q. & PIRES, Melissa Cristina Pinto – Assimetria de Informações e Problemas Regulatórios, fevereiro de 2000. Disponível em http://www.anp.gov.br/doc/notas_tecnicas/Nota_Tecnica_ANP_009_2000.pdf, Acesso em 31 de julho de 2009

CABEZA, Eliane Rocha De La Osa & CAL, Ariane Brito Rodrigues – O Risco de Captura nas Agências de Regulação dos Serviços Públicos: Uma Abordagem à Luz da Teoria Econômica, 2008, Disponível em http://www.workoutenergy.com.br/abar/cbr/Trab0204.pdf - Acesso em 31 de julho de 2009

LINS, Gertrudes Coelho Nadler, TREVAS, José Y Plá, CINTRA, Henrique José de Sobral – Introdução aos Problemas da Qualidade da Informação nos Atos Fiscalizatórios das Agências Reguladoras, trabalho apresentado no V Congresso Brasileiro das Agências Reguladoras ABAR, em 2007.

PIROTTA, Fernanda de Abreu – O fenômeno de captura nas agências reguladoras, 2006. Disponível em http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas/index.php/buscalegis/article/viewArticle/19678 - Acesso em 31 de julho de 2009

BOEHM, Frédéric – Corrupción Y Captura En La Regulación De Los Servicios Públicos, Revista de Economia Institucional, vol. 7, N.º 13, segundo semestre/2005. Disponível em Públicos - http://www.economiainstitucional.com/pdf/No13/fboehm13.pdf, acesso em 24 de julho de 2010.

A Revista

A Revista ANTT é uma publicação eletrônica técnico-científica de periodicidade semestral, criada com a finalidade de divulgar o conhecimento na área de Transportes Terrestres para o público em geral, provocando o intercâmbio de informações. O público-alvo é composto por servidores, colaboradores, meio acadêmico, setor regulado, outros órgãos públicos e profissionais da área.

Entrevistados

  • Edição da Revista:
    Volume 3 Número 2
    Novembro de 2011
  • Josias Sampaio Cavalcante Júnior
    Diretor-Presidente da VALEC
    Edição da Revista:
    Volume 5 Número 1
    Julho de 2013
  • Mário David Esteves Alves
    REFER TELECOM
    Edição da Revista:
    Volume 4 Número 1
    Maio de 2012
  • Luiz Pinguelli Rosa
    Presidente do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas
    Edição da Revista:
    Volume 4 Número 2
    Novembro de 2012
  • Luís Henrique Baldez
    Presidente Executivo da ANUT
    Edição da Revista:
    Volume 3 Número 2
    Novembro de 2011
  • Marcelo Perrupato
    Secretário Nacional de Políticas de Transportes
    Edição da Revista:
    Volume 3 Número 1
    Maio de 2011
  • Paulo Sérgio Oliveira Passos
    Ministro dos Transportes
    Edição da Revista:
    Volume 2 Número 2
    Novembro de 2010
  • José Roberto Correia Serra
    Diretor presidente da CODESP
    Edição da Revista:
    Volume 2 Número 1
    Maio de 2010
  • Bernardo José Figueiredo Gonçalves de Oliveira
    Diretor Geral da Agência Nacional de Transportes Terrestes - ANTT
    Edição da Revista:
    Volume 1 Número 1
    Novembro de 2009
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