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Volume 1 Número 1 - Novembro de 2009
ISSN: 2177-6571

HISTÓRICO E TENDÊNCIAS DA HARMONIZAÇÃO DO TRANSPORTE RODOVIÁRIO DE CARGAS NO MERCOSUL

HISTORY AND TRENDS IN HARMONIZATION OF ROAD CARGO TRANSPORTATION ON MERCOSUL
21/11/2009

Cynthia Bertholini Santos
Marcelo Vinaud Prado

Resumo

Este artigo aborda os principais entraves que afetam o pleno funcionamento do Mercosul no que diz respeito, especificamente ao transporte rodoviário internacional de cargas - TRIC e a melhoria da harmonização do setor a partir da implantação desse Mercado. Para a construção desse pressuposto, é apresentado um breve histórico da evolução do TRIC no Cone Sul, e apontados os avanços conquistados a fim de equilibrar as assimetrias existentes entre os Estados Membros do Mercosul.

Palavras-chave: entraves, transporte, cargas, mercosul, harmonizacao.
Abstract

This article aims at discussing the main obstacles that affect the full functioning of Mercosur, specifically in wich concerns the international cargo transportation and the harmonization of this sector’s rules. In order to formulate this assumption, a brief history of the road cargo transportation in the Southern Cone is presented, and the achievements in the way to reach a balance in the asymmetries between the member states of Mercosur are pointed out.

Keywords: barriers, transportation, cargo, Mercosur, harmonization.

1. Introdução

Nas últimas ultimas décadas do século XX, diversas foram as tentativas de conformação de um mercado comum latino-americano que, na verdade, teve origem no século XIX com o Pan-Americanismo. Atualmente, o Mercado Comum do Sul – Mercosul ainda enfrenta uma série de conturbações para se consolidar num bloco único e vencer a etapa comercial de União Aduaneira.

O transporte, em especial o rodoviário de cargas, é um instrumento para a integração econômica, política, social e cultural entre países. Tanto assim que a importância desse transporte se expressa na quantidade de carga movimentada e seu valor. Essa importância se dá pela atuação dos agentes envolvidos direta e indiretamente no transporte: exportadores, importadores, transportadores e condutores dos veículos – responsáveis diretos pelo deslocamento de cargas, pessoas e bens culturais (GEIPOT, 2001).

Este trabalho busca caracterizar o transporte rodoviário de cargas como elemento de fundamental importância no fluxo de mercadorias entre os países da América do Sul e no processo de integração do Mercosul. Para isso, adota-se a hipótese de que após a implantação do Mercado Comum do Sul houve uma evolução e melhoria da harmonização das regras e na diminuição dos entraves ao pleno funcionamento do Mercosul em relação ao transporte rodoviário de cargas.

Nesse espectro, o artigo foi dividido em cinco seções contando com esta introdução. Na segunda seção, são discutidos conceitos que envolvem a formação do bloco e um breve histórico do Mercosul; a seguir, é discutida a evolução do transporte rodoviário de cargas no Cone Sul no sentido da integração econômica, política, social e cultural da América do Sul; segue-se com o estudo dos principais entraves de funcionamento do transporte rodoviário de cargas nesse escopo, com ênfase nos aspectos históricos, geográficos, econômicos e institucionais que se configuram nas assimetrias entre os países do bloco, salientando os avanços obtidos na melhoria da harmonização dessas diferenças. Por fim, apresentam-se as considerações finais sobre o trabalho.

 

2. Conceitos e Histórico de um Bloco Econômico para América do Sul

Esta seção apresenta os conceitos envolvidos na formação de um mercado comum e uma visão histórica do Mercosul.

2.1. Conceitos Envolvidos na Formação de Blocos Econômicos

A interação e interdependência entre as nações têm levado os países a adotarem soluções integradas para problemas comuns. Para tanto, a criação de órgãos supranacionais, dentre eles os blocos econômicos, tem o objetivo de alcançar o equilíbrio das relações entre as nações e se configura como alternativa constante e atual. Os blocos econômicos surgem principalmente para facilitar o comércio entre seus países partes, seguindo objetivos básicos como: redução ou isenção de impostos ou de tarifas alfandegárias, simplificação de procedimentos burocráticos e maior tráfego de mercadorias e serviços (SANTOS, 2006).

Segundo a teoria econômica (SERRA, 2005), existem 6 (seis) possibilidades de integração entre os países, sendo que cada etapa só pode ser alcançada em seqüência.

TABELA 1 - Etapas oficiais de Integração entre países

 

Etapas oficiais de Integração entre países
1. Área de tarifas preferenciais: quando dois ou mais países decidem promover uma redução tarifária parcial, de maneira recíproca ou não.
2. Área de livre comércio: quando dois ou mais países optam por promover uma alíquota tarifária de importação igual a zero, mutuamente. Exemplo: Nafta.
3. União aduaneira: quando dois ou mais países aprovam, além dos benefícios da área de livre comércio, a criação de uma tarifa externa comum (TEC). Exemplo: o atual estágio do Mercosul. (grifo nosso)
4. Mercado comum: quando dois ou mais países decidem, a partir da situação de uma união aduaneira, liberar o fluxo de mão-de-obra e capital.
5. União monetária ou econômica: quando dois ou mais países optam, a partir do estágio de um mercado comum, pela criação de uma moeda comum, unificando as políticas externa e de defesa, criando praticamente um novo país. Exemplo: União Européia.
6. Integração Econômica Total: quando passam a ser adotadas políticas monetárias, fiscais e sociais comuns, estabelecendo-se uma autoridade supranacional, encarregada da elaboração e aplicação dessas políticas.

Fonte: Mercosul. Adaptado http://www.camara.gov.br/mercosul/blocos/introd.htm , acesso em 28/08/2009.

Teoricamente, a criação desses blocos visa o crescimento de seus membros, normalmente países vizinhos, com afinidades comerciais, culturais, sociais, políticas, etc. A necessidade premente de formação de blocos econômicos na busca da maximização da eficiência comercial resultou nos blocos econômicos conhecidos atualmente, conforme Tabela 2.

TABELA 2 – Principais Blocos Econômicos do Mundo

 

PRINCIPAIS BLOCOS ECONÔMICOS DO MUNDO
Nafta – Acordo de Livre Comércio do Norte Estados Unidos, México e Canadá. Funciona desde 1994. Oferece aos países membros vantagens no acesso aos mercados dos países. Estabeleceu o fim das barreiras alfandegárias, regras comerciais em comum, proteção comercial e padrões e leis financeiras. Não é uma zona livre de comércio, porém reduziu tarifas de aproximadamente 20 mil produtos.
Pacto Andino Bolívia, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela. Criado em 1969 para integrar economicamente os países membros. As relações comerciais desses países chegam a valores importantes, embora os EUA sejam o principal parceiro econômico do bloco.
Mercosul – Mercado Comum do Sul Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai e Venezuela. Estuda-se a entrada de novos membros, como o Chile e a Bolívia. Oficialmente estabelecido em março de 1991. O objetivo principal do Mercosul é eliminar as barreiras comerciais entre os países, aumentando o comércio entre eles; estabelecer tarifa zero entre os países, e num futuro próximo, uma moeda única.
Apec – Cooperação Econômica da Ásia e do Pacífico EUA, Japão, China, Formosa (Taiwan), Coréia do Sul, Hong Kong, Cingapura, Malásia, Tailândia, Indonésia, Brunei, Filipinas, Austrália, Nova Zelândia, Papua Nova Guiné, Canadá, México e Chile. Criada em 1993 na Conferência de Seattle (Estados Unidos). Somadas a produção industrial de todos os países, chega-se à metade de toda produção mundial. Quando estiver em pleno funcionamento, será o maior bloco econômico do mundo.
UE – União Européia Alemanha, França, Reino Unido, Irlanda, Holanda (Países Baixos), Bélgica, Dinamarca, Itália, Espanha, Portugal, Luxemburgo, Grécia, Áustria, Finlândia e Suécia. Oficializada no ano de 1992, por meio do Tratado de Maastricht. Possui moeda única (Euro), sistema financeiro e bancário comum. A UE também possui políticas trabalhistas, de defesa, de combate ao crime e de imigração em comum, além dos seguintes órgãos: Comissão Européia, Parlamento Europeu e Conselho de Ministros.

Fonte: Economia Internacional. Extraído de Banco Mundial, World Economic Outlook Database, Outubro de 2007, para o ano de 2006.

2.2. Histórico do Mercosul

A formação do Mercosul teve origem no Tratado de Assunção, assinado em 26/03/1991 pela Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, com o objetivo de formar um mercado comum do sul. Em 1994, por meio da assinatura do Protocolo de Ouro Preto – um complemento ao Tratado de Assunção – o Mercosul foi reconhecido jurídica e internacionalmente como uma organização.

Entretanto, as tentativas de integrar a América Latina, como um só bloco, remontam ao século XIX – o pan-americanismo, quando o venezuelano general e líder revolucionário Símon Bolívar já buscava promover a integração do Continente, em 1826, com a realização do Congresso do Panamá em que participaram os governos da Colômbia, Guatemala, México, Peru e Estados Unidos (FERNANDES, 2008). A América do Sul, desde a sua apropriação pelas nações colonizadoras, foi alvo de disputa territorial entre portugueses e espanhóis (o Uruguai, por exemplo, já foi de domínio espanhol, português e novamente espanhol), apontava para um cenário que esboçaria a necessidade de emancipação econômica e política dos membros do Mercosul.

Nos séculos XVI e XVII, as colônias espanholas foram organizadas de maneira a escoar e receber mercadoria somente por determinados portos. Buenos Aires que ficara fora da rota traçada, portanto fadada ao isolamento econômico, lançou mão do intercâmbio comercial, a princípio ilegal, com o Brasil, iniciando uma relação comercial que só cresceria com o passar do tempo.

Foi em 1941, em meio à 2ª Guerra Mundial, que Argentina e Brasil tentaram pela primeira vez estabelecer uma união aduaneira entre suas economias. As divergentes posições diplomáticas adotadas pelos dois países em relação à política do Eixo (Alemanha, Itália, Japão e outros), entretanto, afastaram a formação do bloco comercial entre Argentina e Brasil.

Desde então, foram firmados vários tratados e existiram diversas organizações com o propósito de integrar social e economicamente as Américas, como segue:

  • Comissão Econômica para a América Latina – Cepal, criada em 1948 para desenvolver estudos com foco na integração das nações, ampliação dos mercados regionais e crescimento industrial.
  • Associação Latino Americana de Livre Comércio – ALALC, criada em 1960 também com o objetivo de integração regional, não frutificou. Os países sul-americanos não tinham estrutura para competir num cenário internacional neoliberal, além de terem sido duramente atingidos pela crise do petróleo.
  • Pacto Andino – criado em 1969 para facilitar a integração econômica de Bolívia, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela (países andinos) e tendo o Chile e o Panamá como observadores.
  • Associação Latino-Americana de Integração – Aladi, criada em 1980, por meio do Tratado de Montevidéu, em substituição à ALALC, para integrar economicamente Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, México, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela. Neste mesmo ano, os países latino-americanos iniciam as tratativas de integração que tiveram como marco fundamental a Declaração Conjunta de Iguaçu (1985). Pouco depois, em 1986, é assinada a Ata para Integração Argentina-Brasil que criou o Programa de Integração e Cooperação Econômica (PICE), visando à modernização tecnológica para garantir uma maior eficiência na aplicação de recursos das duas economias. Em 1988, com a decisão Tripartite nº 01, o Uruguai participa desse processo de integração.
  • Tratado de Buenos Aires – assinado, em 1990, pela Argentina e Brasil para integração econômica entre as duas nações, de forma a estabelecer um Mercado Comum entre ambos os países, com prazo definido de instalação até o fim de 1994. Para tanto, foi criado o Grupo Mercado Comum (GMC) e 10 Subgrupos Técnicos de Trabalho (SGT) para cada setor envolvido no processo de integração. Ainda em 1990, o GMC finalizou o Acordo de Complementação Econômica entre Argentina e Brasil, em que foram consolidados todos os acordos bilaterais outrora firmados, e estabeleceu as regras para a formação do Mercado Comum.
  • Tratado de Assunção – assinado, em 1991, pela Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai. Foi um complemento ao Tratado de Buenos Aires, com a adesão desses dois últimos países e o embrião para a constituição do Mercado Comum do Sul – Mercosul.

O Tratado de Assunção assim definiu sobre o que seria o Mercosul:

Artigo 1º:

Os Estados Partes decidem constituir um Mercado Comum que deverá estar estabelecido a 31 de dezembro de 1994, e que se denominará "Mercado Comum do Sul" (Mercosul). Este Mercado Comum implica:

A livre circulação de bens serviços e fatores produtivos entre os países, através, entre outros, da eliminação dos direitos alfandegários restrições não tarifárias à circulação de mercado de qualquer outra medida de efeito equivalente;

O estabelecimento de uma tarifa externa comum e a adoção de uma política comercial comum em relação a terceiros Estados ou agrupamentos de Estados e a coordenação de posições em foros econômico-comerciais regionais e internacionais;

A coordenação de políticas macroeconômicas e setoriais entre os Estados Partes - de comércio exterior, agrícola, industrial, fiscal, monetária, cambial e de capitais, de serviços, alfandegária, de transportes e comunicações e outras que se acordem -, a fim de assegurar condições adequadas de concorrência entre os Estados Partes; e

O compromisso dos Estados Partes de harmonizar suas legislações, nas áreas pertinentes, para lograr o fortalecimento do processo de integração.

O Mercosul foi criado, dessa forma, como um programa de integração econômica, composto atualmente por Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai. Conhecido também como Cone Sul porque, originalmente, sua formação constituía-se das nações do sul do da América (Argentina, Chile, Uruguai e eventualmente Paraguai), dando ao bloco o formato de um cone, o Mercosul vislumbrou o estabelecimento de uma aliança que possibilitaria a movimentação de mercadorias, capitais, pessoas, força de trabalho, de maneira a dinamizar a economia dessa região.

Num primeiro momento, o Mercosul seria uma zona de livre comércio, sem tributação ou restrição às importações entre os países signatários. A partir de 01/01/1995, essa zona é convertida em união aduaneira – os Estados Partes podem cobrar alíquotas iguais nas importações dos demais países, cumprindo-se, assim, o previsto no Tratado de Assunção.

Em 1996, a Bolívia e o Chile passam a membros associados do Mercosul. Atualmente, o Chile está em processo de se tornar membro pleno – Estado Parte. Outros países latino-americanos têm demonstrado interesse em participar do bloco Mercosul.

No Protocolo de Ouro Preto, assinado em 1994, foram definidas as 3 (três) seguintes instâncias de decisão no Mercosul: uma política (Conselho), uma executiva (Grupo) e uma técnica (Comissão). Esse mesmo Protocolo foi também a ferramenta para que o Mercosul viesse a ter personalidade jurídica de direito internacional, permitindo a relação com outros países, blocos econômicos e organismos internacionais.

 

3. Evolução do Transporte Rodoviário de Cargas – TRC no Mercosul

Esta seção é introduzida com os aspectos legais do transporte rodoviário de cargas no Mercosul e retrata a evolução deste transporte com dados estatísticos.

3.1. Aspectos Legais do TRC no Mercosul

De acordo com a Associação Latino-Americana de Integração – Aladi, define-se o transporte internacional de carga (TIC) como a operação de transladar produtos (carga), fornecendo um serviço, por um preço denominado frete, desde o país de origem (exportador) até o país de destino (importador). O Transporte Internacional de Carga pode ser realizado nas modalidades aérea, por água (marítima e fluvial), terrestre (rodoviária e ferroviária) ou por uma combinação de duas ou mais dessas modalidades (transporte intermodal).

A realização do transporte rodoviário de cargas se conforma em normas estabelecidas em acordos internacionais sobre transporte e trânsito. Historicamente, o Brasil mantém acordos internacionais de transporte terrestre com quase todos os países da América do Sul. Sua dimensão e localização geográfica tem sido preponderante nesse sentido.

No caso do Mercosul, adota-se o Acordo de Transportes do Cone Sul, isto é o Acordo Sobre Transporte Internacional Terrestre – ATIT, firmado entre a Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Peru, Paraguai e Uruguai, que contempla tanto o transporte rodoviário, quanto o ferroviário. O ATIT permite a regulamentação conjunta do transporte internacional terrestre na América do Sul. Possibilita a “garantia de regularidade de atendimento, bem como definições pertinentes a direitos e obrigações de usuários e transportadores” (LOPEZ, 2000).

No Brasil, a Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTT é o órgão competente para negociação e aplicação dos acordos internacionais. A Resolução ANTT nº 1.474, de 31 de maio de 2006, publicada no D.O.U. de 05 de junho de 2006, é o instrumento legal que disciplina o exercício da atividade de transporte internacional de cargas.

3.2. Evolução do TRC no Mercosul

Inicialmente, percebe-se que as estatísticas indicam um incremento nas transações comerciais entre os países membros do Mercosul desde sua implantação, com oscilações eventuais resultantes de instabilidade econômica e/ou política de seus Estados Partes.

As trocas comerciais entre Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai cresceram de US$ 5,1 bilhões, em 1991, para acima de US$ 20 bilhões, em 1997 e 1998, ou seja, da implantação do Tratado de Assunção em 1991, passando pela instalação do Mercosul em 1994. Na relação comercial direta dos países membros do Mercosul com o Brasil, fica evidente a importância do tráfego bilateral entre este último e a Argentina, para o qual seguem mais de 80% das exportações. Desde 1998, a Argentina tornou-se o segundo mercado para vendas brasileiras, depois apenas dos E.U.A.

TABELA 3 - Transporte efetuado entre o Brasil e os países do Mercosul
Exportação e Importação (em tonelagem) – 2008

 

EXPORTAÇÃO (em tonelagem) – 2008
PAÍSES MODALIDADE
  MARÍTIMA FLUVIAL FERROVIÁRIA RODOVIÁRIA OUTROS¹
Argentina 8.368.618 2.528.220 138.228 2.222.738 29.379
Paraguai 268.088  192.326 151.589 1.443.403 102.818
Uruguai 408.131 - - 566.896 18.541
TOTAL 9.044.837 2.720.546 289.817 4.233.037 150.738
¹Lacustre, aérea, tubo-conduto e carga própria   
           
IMPORTAÇÃO (em tonelagem) – 2008
PAÍSES MODALIDADE
  MARÍTIMA FLUVIAL FERROVIÁRIA RODOVIÁRIA OUTROS¹
Argentina  8.102.947 24.025 232.641 2.790.566 138.896
Paraguai 76.879 1.690 58.848 2.085.622 12.002
Uruguai 399.440 2.155 26.755 589.696   567
TOTAL 8.579.266 27.870 318.244 5.465.884 151.465
¹Lacustre, aérea, tubo-conduto e carga própria   

Fonte: Sistema Alice - Ministério do Desenvolvimento Indústria e Comércio - MDIC

O comércio entre o Brasil e os países do Mercosul registrou forte crescimento quando passou de US$ 8,9 bilhões, em 2002, a US$ 28,9 bilhões, em 2007. Se incluída a Venezuela, os valores globais da troca comercial do Brasil com o Mercosul somariam o total de US$ 33,97 bilhões, em 2007 (MRE, 2009).

Se for contabilizado o fluxo de caminhões nas principais fronteiras, a movimentação de veículos de carga chega a 488 mil no ano de 2008.

TABELA 4 - Fluxos do TRIC nos principais pontos de fronteira

 

Principais Fronteiras Total Importação + Exportação
2007 2008 Jan-Jun 2009
Uruguaiana -BR / Paso de Los Libres – AR 185.814 169.207 60.416
Itaqui - BR / Alvear – AR 6.623 5.393 3.381
São Borja - BR / Sto.Tomé – AR 63.203 70.649 28.488
Porto Xavier - BR / San Javier – AR 16.725 16.742 8.076
Dionísio Cerqueira-BR/Bernardo de Irigoyen – AR 19.577 18.419 9.625
Guaíra – BR / Salto del Guairá – PY 18.828 18.934 5.326
Chui - BR / Chuy – UY 25.747 24.343 11.163
Jaguarão - BR / Rio Branco – UY 19.561 15.779 8.172
Santana do Livramento -BR / Rivera – UY 13.272 15.009 6.641
Barra do Quarai - BR / Bella Union – UY 544 246 102
Tríplice Fronteira BR/AR/PY (Foz do Iguaçu – PR/BR) 137.161 133.308 62.457

Fonte: Fluxo dos Portos Fronteiras. Extraído de http://www.abti.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=265&Itemid=111, acesso em 26/08/2009.

 

4. Entraves ao TRC no Mercosul

A integração plena de países com características tão distintas como os que compõem o Mercosul é complexa. As diferenças econômicas, políticas, geográficas, sociais, legais, culturais são, em muitos aspectos, obstáculos a serem vencidos para viabilizar a “abertura de fronteiras”.

Ressalte-se que são relações entre países com um forte braço estatal e burocrático. E que, embora o ATIT tenha sido firmado considerando “a necessidade de se adotar uma norma jurídica única que reflita os princípios essenciais” acordados pelos governos signatários (ATIT, 1990), não há nessa norma um caráter de supranacionalidade. Ou seja, os Estados Partes é que deverão empenhar-se no cumprimento de acordos bilaterais, visando harmonizar suas legislações, disponibilidades técnicas-operacionais, entre outras.

Como citado anteriormente, há também os entraves legais. Enquanto no Brasil, por exemplo, a Constituição tem precedência sobre os tratados internacionais, na Argentina ocorre o contrário. Para a homogeneização jurídica do Mercosul, a princípio, os países partes teriam que renunciar à sua soberania no que concerne aos temas acordados. Certamente tal exigência criaria uma assimetria incômoda para os sócios, gerando uma potencial indefinição jurídica na região (GIAMBIAGI e MARKWALD, 2002).

Por outro lado, para a diplomacia brasileira, o Mercosul tem um papel importante para a consolidação da estabilidade política entre seus Estados Partes (MRE, 2006).

Observa-se que a busca de soluções em grupo que tragam vantagens para todas as partes tem sido um processo gradativo. Cada país tem o seu tempo de ajuste e adaptação a mudanças. O objetivo principal é aproveitar os benefícios que a união continental impinge e tentar atenuar as possíveis “desvantagens” às quais a aproximação fronteiriça expõe os Países, entre elas os atritos políticos e retaliações de ordem operacional (GIAMBIAGI e MARKWALD, 2002).

Nesse sentido, Barbosa (2001) indica que, com a integração acontecendo de maneira física, nos setores de transporte, energia e comunicação, principalmente, a percepção desses benefícios se dará de forma mais clara. O autor afirma, ainda, que em bloco a inserção na economia mundial é muito mais factível.

As controvérsias que ocorreram em várias situações entre os sócios do Mercosul, principalmente Argentina e Brasil, derivam de problemas conjunturais, dentre os quais a instabilidade econômica desses países. Os brasileiros sofreram com o problema durante os três primeiros anos da integração, convivendo com altíssimas taxas de inflação e incertezas. Os argentinos, com o colapso do sistema cambial no final de 2001 e início de 2002, tiveram de adotar medidas drásticas para fomentar o seu processo de industrialização (OLIVEIRA, 2006).

Dentro desse contexto, deve-se compreender a dimensão dessas disparidades econômicas. O Brasil é o segundo país mais pobre do Mercosul, à frente apenas do Paraguai. Em contrapartida, possui o maior PIB do bloco. Face a essa realidade, a promoção de um processo econômico de integração do grupo, capitaneado pelo Brasil, fica cada vez mais longe, dada a dificuldade do País em resolver seus problemas internos e conseguir se equiparar em termos de ambiente sócio institucional com os outros membros do Mercosul (GIAMBIAGI e MARKWALD, 2002).

Por outro lado, pode-se perguntar o que aconteceria se o Mercosul acabasse. No questionamento de Giambiagi e Markwald (2002), pode-se verificar a necessidade de continuidade da integração do Mercosul:

Qual a melhor estratégia, do ponto de vista de cada país, para encarar o mundo que se pode esperar que vigore na altura de 2015, quando poderemos ter uma área de livre-comércio do Alasca até a Terra do Fogo? Para o Brasil e a Argentina, é melhor chegar a essa situação, unidos ou separados?

Do ponto de vista dos acordos bilaterais de transporte terrestre, torna-se inverossímil o retrocesso do Mercosul, dado ao avanço experimentado pelas partes durante as ultimas décadas. Percebe-se que o Projeto de Harmonização de Normas de Transporte Terrestre na América do Sul reforça essa idéia (ALADI, 2001):

Um acordo de alcance parcial gerador de uma norma nova, que contemple os avanços a nível bilateral ou sub-regional (por exemplo, o Acordo Tripartite Nº 1 entre a Argentina, Brasil e Uruguai), em essência seria uma superação ou verdadeira atualização do ATIT, que obviamente operaria, em grande medida, como texto de referencial, embora não de forma exclusiva.

 

5. Considerações Finais

O curto prazo de existência do bloco é insuficiente para que se possa fazer uma previsão com respaldo histórico sobre o futuro do mesmo. Entretanto, de certa forma, percebe-se que houve incremento comercial desde a implantação do Mercosul e, especificamente no que diz respeito ao transporte rodoviário internacional de cargas, o avanço foi notável.

Faz-se necessário um tempo de amadurecimento para consolidação do bloco. Tendo em vista as assimetrias entre os países do Cone Sul, é de se esperar que esse tempo tenha uma relatividade maior que em outros blocos mundiais.

Conclui-se que a integração deve seguir seu passo em ritmo sustentável e que a ênfase na evolução do Mercosul ainda está na consolidação e no aprofundamento da União Aduaneira.

Entende-se que é exatamente por meio das negociações bilaterais de transporte terrestre que são verificados os principais avanços na harmonização das regras no Mercosul. No que concerne ao Brasil, a estratégia tem se pautado na busca de soluções pela diplomacia e concessões.

A posição que o Brasil vem defendendo nas reuniões do SGT-5, e mesmo nas bilaterais, principalmente com a Argentina, é a 5ª liberdade, onde seria possível participar do tráfego entre terceiros países (SILVA, 2004). Pode-se identificar no Acordo Tripartite nº 1 entre Argentina, Brasil e Uruguai, em que cada um dos países pode transportar no tráfego bilateral dos outros dois, desde que transitado pelo primeiro,um embrião da 5ª liberdade. Outro exemplo claro é o acordo sobre a participação da Argentina do tráfego Brasil/Chile, desde 2007.

Esse é com certeza um movimento de vanguarda, que trará uma maior competitividade para as empresas de transportes, tenderá a diminuir o valor do frete e otimizará os percursos de transporte. Mas, ainda demandará tempo pelo arrojo e diferenças de capacidade de oferta, dimensões geográficas, econômicas, etc., de cada um dos Estados do Cone Sul.


Referências

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A Revista

A Revista ANTT é uma publicação eletrônica técnico-científica de periodicidade semestral, criada com a finalidade de divulgar o conhecimento na área de Transportes Terrestres para o público em geral, provocando o intercâmbio de informações. O público-alvo é composto por servidores, colaboradores, meio acadêmico, setor regulado, outros órgãos públicos e profissionais da área.

Entrevistados

  • Edição da Revista:
    Volume 3 Número 2
    Novembro de 2011
  • Josias Sampaio Cavalcante Júnior
    Diretor-Presidente da VALEC
    Edição da Revista:
    Volume 5 Número 1
    Julho de 2013
  • Mário David Esteves Alves
    REFER TELECOM
    Edição da Revista:
    Volume 4 Número 1
    Maio de 2012
  • Luiz Pinguelli Rosa
    Presidente do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas
    Edição da Revista:
    Volume 4 Número 2
    Novembro de 2012
  • Luís Henrique Baldez
    Presidente Executivo da ANUT
    Edição da Revista:
    Volume 3 Número 2
    Novembro de 2011
  • Marcelo Perrupato
    Secretário Nacional de Políticas de Transportes
    Edição da Revista:
    Volume 3 Número 1
    Maio de 2011
  • Paulo Sérgio Oliveira Passos
    Ministro dos Transportes
    Edição da Revista:
    Volume 2 Número 2
    Novembro de 2010
  • José Roberto Correia Serra
    Diretor presidente da CODESP
    Edição da Revista:
    Volume 2 Número 1
    Maio de 2010
  • Bernardo José Figueiredo Gonçalves de Oliveira
    Diretor Geral da Agência Nacional de Transportes Terrestes - ANTT
    Edição da Revista:
    Volume 1 Número 1
    Novembro de 2009
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