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Volume 2 Número 1 - Maio de 2010
ISSN: 2177-6571

O SISTEMA GLOBALMENTE HARMONIZADO DE CLASSIFICAÇÃO E ROTULAGEM DE SUBSTÂNCIAS QUÍMICAS - GHS E A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA DE TRANSPORTE TERRESTRE DE PRODUTOS PERIGOSOS

THE GLOBALLY HARMONIZED SYSTEM OF CLASSIFICATION AND LABELLING OG CHEMICALS - GHS AND BRAZILIAN DANGEROUS GOOD ROAD TRANSPORTATION RULES
21/05/2010

Tatiana Furtado Alvim
Agência Nacional de Transportes Terrestres
Rodrigo Lucius de Amorim
Agência Nacional de Transportes Terrestres

Resumo

O objetivo deste artigo é discorrer sobre dois sistemas que dizem respeito à classificação de produtos químicos. O primeiro é o Sistema Globalmente Harmonizado de Classificação e Rotulagem de Produtos Perigosos – GHS, que tem o objetivo de harmonizar, em todo o mundo, a classificação de produtos químicos, a sinalização de seus perigos e a elaboração de fichas de dados de segurança. O GHS está em fase de implementação no Brasil. O segundo concerne ao sistema atualmente utilizado no país para classificar os produtos químicos como perigosos ou não para o transporte terrestre. Cabe não só esclarecer os diferentes objetivos e aplicabilidades dos dois sistemas, mas também analisar a existência de pontos conflitantes, no que tange principalmente à classificação das substâncias e sinalização de perigos e riscos.

Palavras-chave: transporte rodoviario, ghs, produtos perigosos, classificacao, pictogramas.
Abstract

The purpose of the present paper is to provide information about two different systems related to the classification of chemicals. The Globally Harmonized System of Classification and Labelling of Chemicals - GHS, being implementated in Brazil, aims to globally harmonize the classification of chemicals, labels and safety data sheets. The other system is the currently used in Brazil to classify chemicals as dangerous or not for road transportation. It also should clarify the different goals and applicability of both systems, analyse the existence of conflicting points, especially with regard to classification of the substances and signaling of its hazards and risks.

Keywords: road transport, GHS, dangerous goods, classification, pictogram.

1. INTRODUÇÃO

A utilização de produtos químicos com possíveis efeitos adversos às pessoas e ao meio ambiente é vasta não só em diversos ambientes de trabalho, mas também na rotina de grande parte da população. Em função disso, governos e organizações têm regulado, ao longo dos anos, por meio de instrumentos legais, a transmissão das informações aos usuários de produtos químicos por intermédio de rótulos e fichas de dados de segurança.

Embora tais instrumentos legais sejam similares em diversos aspectos nos diversos países, as diferenças existentes são suficientes para gerar desde pequenas incoerências em fichas de dados de segurança até classificação de perigo discrepante para um mesmo produto. Por exemplo, uma substância pode vir a ser classificada como inflamável em um país, e não em outro, em função dos diferentes sistemas de classificação utilizados. Ademais, decisões de quando comunicar riscos em etiquetas ou fichas de dados de segurança podem variar entre os países. Essas e outras situações, além de trazerem incertezas ao consumidor e usuário e de não alertarem sobre possíveis riscos associados ao uso, afetam o comércio internacional. Companhias interessadas em exportação de produtos químicos devem dispor de conhecimento técnico suficientemente eficiente para acompanhar mudanças nos regulamentos de diversos países e para preparar diferentes fichas de segurança e rótulos em função das exigências dos destinos de exportação.

 

2. ORIGEM, ORGANIZAÇÃO E OBJETIVO DO GHS

No âmbito da Organização das Nações Unidas-ONU, foi publicada em 2003 a primeira edição do GHS-Globally Harmonized System of Classification and Labelling of Chemicals (Sistema Globalmente Harmonizado de Classificação e Rotulagem de Produtos Químicos) sob a premissa de que devem ser harmonizados os sistemas existentes, que regem a classificação de substâncias químicas, seus rótulos e fichas de dados de segurança.

“A harmonização da comunicação de perigos teve início em 1989, época em que a Organização Internacional do Trabalho (OIT) elaborou e adotou a Convenção 170 e a Recomendação 177 sobre Segurança no Uso de Produtos Químicos no Trabalho. Por meio desses instrumentos, os países que as ratificaram, incluindo o Brasil, obrigaram-se a adotar um sistema para classificação e rotulagem de produtos químicos.

Em 1992, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (UNCED - RIO 92) aprovou a harmonização dos sistemas de classificação de produtos químicos e criou comitês incumbidos de desenvolver o novo sistema de classificação e de rotulagem. Esse trabalho foi concluído em 2002 e endossado pelo Conselho Econômico e Social da ONU em 2003, ocasião em que foi publicada a primeira versão do “Livro Púrpura”.

O GHS é uma recomendação das Nações Unidas, e incluí-lo nas normativas nacionais é de caráter voluntário. Desse modo, sua adoção depende da conscientização e do comprometimento dos governos nacionais e do setor privado para que sejam feitas as mudanças legais necessárias em cada país.

“Consciente da importância e da complexidade da implantação desse sistema, o governo brasileiro instituiu, por meio do Decreto de 26 de junho de 2007, um grupo de trabalho Interministerial denominado GT-GHS-Brasil” (MDIC, 2009).

Tal grupo tem a atribuição de elaborar e propor estratégias, diretrizes, programas, planos e ações para a implementação do GHS no país. É coordenado pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior e conta, dentre outros, com representantes da Agência Nacional de Transportes Terrestres em nome do Ministério dos Transportes.

Assim, o GHS não só abrange critérios harmonizados para a classificação tanto de substâncias e misturas que contêm produtos químicos, de acordo com os perigos físicos à saúde e ao meio ambiente como também promove a harmonização da comunicação dos elementos de perigos, incluindo os requisitos para rotulagem e elaboração das fichas de dados de segurança.

 

3. A HARMONIZAÇÃO DA CLASSIFICAÇÃO DE PRODUTOS COMO PERIGOSOS PARA O TRANSPORTE TERRESTRE

O trabalho de harmonização, entretanto, não é totalmente novo no país, haja vista já se encontrar amplamente difundido e sustentado um conceito harmonizado de classificação e sinalização no que diz respeito aos perigos físicos e toxicidade aguda aplicados à atividade de transporte terrestre de produtos perigosos, com base no Comitê Econômico e Social de Peritos no Transporte de Produtos Perigosos das Nações Unidas- UNCSDTG.

 

4. O TRANSPORTE DE PRODUTOS PERIGOSOS NO BRASIL

4.1. VISÃO DO SETOR

A partir da década 70, é observado aumento na ocorrência e na gravidade dos acidentes de trânsito no país, devido ao fato de que o uso dos modos motorizados, por exemplo, o automóvel, ter começado a ser considerado essencial na vida urbana. Neste período, também é observado um aumento da atividade econômica da indústria química no Brasil, acompanhado da necessidade de transporte de tais produtos que, assim como as demais cargas, são sujeitos a acidentes rodoviários. Ainda hoje se observa que a política adotada pelo Brasil privilegia o uso do modo rodoviário no transporte de cargas, incluindo as perigosas, em detrimento do uso dos demais modais. Aproximadamente 70% do transporte de produtos considerados perigosos é feito por rodovias. (Alves et al, 2010)

Quando não é realizado de forma correta, o transporte rodoviário de produtos perigosos pode apresentar sérios impactos ao meio ambiente, à população e à segurança pública, devido às propriedades dos materiais transportados, tais como inflamabilidade, toxicidade e corrosividade. A ocorrência de acidentes com esse tipo de produto representa graves riscos à segurança e à saúde da população. Pode, também, comprometer a sustentabilidade, devido à vulnerabilidade e sensibilidade ambiental das áreas impactadas.

Segundo a CNT, durante o ano 1994, 2% dos veículos pesados que transitaram em rodovias federais transportavam produtos perigosos, dos quais líquidos e sólidos inflamáveis, gases comprimidos, liquefeitos ou dissolvidos sob pressão representaram 90% do total transportado. Em termos de tonelagem, os líquidos inflamáveis foram responsáveis por 48% do total. É conveniente destacar que caminhões que transportam líquidos inflamáveis, até mesmo quando descarregados, representam uma fonte de perigo adicional no tráfego rodoviário. (Real, 2000)

Com o objetivo de agregar-se o maior grau de segurança, confiabilidade e profissionalismo ao transporte de tal tipo de produto, a atividade é altamente regulamentada e acompanhada.

4.2 REGULAMENTAÇÃO

O transporte rodoviário e ferroviário de produtos perigosos, no âmbito nacional e por vias públicas, é disciplinado, respectivamente, pelos Decretos nº. 96.044/88 e 98.973/90 e complementados pelas instruções da Resolução ANTT nº. 420/04 e suas alterações, sem prejuízo da legislação e disciplina peculiar a cada produto.

A Resolução ANTT nº. 420/04 especifica exigências detalhadas aplicáveis ao transporte terrestre de produtos perigosos. Tal regulamento está elaborado com base na décima primeira e décima segunda edições das Recomendações para o Transporte de Produtos Perigosos das Nações Unidas, conhecido como Orange Book, e na edição de 2001 do Acordo Europeu para o Transporte de Produtos Perigosos - ADR.

O documento, além de trazer uma lista de aproximadamente 3000 produtos perigosos, os mais comumente transportados, dispõe sobre as exigências relacionadas à classificação dos produtos; embalagens e tanques; marcação e rotulagem; identificação de unidades de transporte e de carga; documentação; prescrições especiais relativas às operações de transporte.

4.3 CRITÉRIOS DE CLASSIFICAÇÃO PARA O TRANSPORTE

Convém, inicialmente, compreender como dados produtos vêm a ser considerados perigosos para o transporte terrestre.

A classificação de um produto como perigoso para o transporte terrestre deve ser feita pelo seu fabricante, que é o real conhecedor da substância, ou pelo expedidor orientado pelo fabricante, tomando como base as características físico-químicas do mesmo. Procede-se, então, à alocação a uma das classes ou subclasses de risco seguintes: (Resolução ANTT nº. 420/04).

TABELA 1: Classificação de Produtos Perigosos

Classes Característica
Classe 1 Explosivos
Classe 2 Gases
Classe 3 Líquidos Inflamáveis
Classe 4 Sólidos inflamáveis, substâncias sujeitas a combustão espontânea, substâncias que em contato com água emitem gases inflamáveis
Classe 5 Substâncias oxidantes e peróxidos orgânicos
Classe 6 Substâncias tóxicas e substâncias infectantes
Classe 7 Material radioativo
Classe 8 Substâncias corrosivas
Classe 9 Substâncias e artigos perigosos diversos

Fonte: Resolução ANTT nº. 420/04

Entretanto, os critérios para a realização da referida classificação não são aleatórios, uma vez que não pode ser utilizado um tipo de teste por cada fabricante ou expedidor de produto perigoso. Com isso, objetiva-se agregar confiabilidade ao que for declarado, além de promover uma harmonização das classificações no país.

Assim, os testes e ensaios exigidos para a classificação de produtos como perigosos para o transporte terrestre a serem utilizados atualmente devem tomar como base as disposições da publicação Recommendations on the Transport of Dangerous Goods, Manual of Tests and Criteria (ST/SG/AC.10/11 Ver. 3) da Organização das Nações Unidas-ONU.

O objetivo da publicação supracitada é apresentar o esquema de classificação elaborado pelas Nações Unidas para certos tipos de produtos perigosos e descrever os testes, métodos e procedimentos considerados como os mais confiáveis e eficazes pelas autoridades competentes, o que agrega informação suficiente para que se promova uma classificação apropriada de produtos como perigosos para transporte.

Como o objetivo de aliar confiabilidade às classificações dadas, as condições prescritas para a realização dos referidos testes devem ser seguidas da maneira mais próxima possível da descrita em tal publicação. Deve-se notar, entretanto, que é transferida a competência pela classificação para a autoridade responsável por proceder à realização dos testes. É tal autoridade que assume o poder de dispensar algumas exigências, variar detalhes dos procedimentos e requerer ensaios adicionais justificadamente a fim de obter classificação confiável e realista do risco do produto.

 

5. CONCEITO DE RISCO X PERIGO

O entendimento dos termos “risco” e “perigo” como sinônimos é muito frequente tanto na interpretação de documentos como na interpretação de artigos científicos, textos técnicos e outros.

Convém transcrever a própria consideração sobre risco e perigo dada pelo GHS:

“O risco e consequentemente a comunicação de tal informação é obtida quando a exposição é ponderada juntamente com o perigo (...)

Perigo X Exposição = Risco” (GHS , 2005)

O entendimento da diferença conceitual entre ambos é peça fundamental para compreensão da ausência de incoerência quando é observada uma classificação diferente para um mesmo produto dada pelo GHS e pela legislação de transporte de produtos perigosos.

TABELA 2: Comparação entre os conceitos de risco e perigo

Risco X Perigo
“Risco é a probabilidade ou chance de lesão ou morte”
(Sanders e Mc Cornick, p. 675)
“Perigo é uma condição ou um conjunto de circunstâncias que têm o potencial de causar ou contribuir para uma lesão ou morte” (Sanders e Mc Cornick, p. 675)
Risco “(...) é uma função da natureza do perigo, acessibilidade ou acesso de contato (potencial de exposição), características da população exposta (receptores), a probabilidade de ocorrência e a magnitude da exposição e das consequências (...)” (Kolluru, 1996, p1.10) “Um perigo é um agente químico, biológico ou físico (incluindo-se a radiação eletromagnética) ou um conjunto de condições que apresenta uma fonte de risco, mas não o risco em si”  (Kolluru, 1996, p1.10)
“(...) risco é um resultado medido do efeito potencial do perigo” (Shinar, Gurion e Flascher, 1991, p. 1095) Perigo é a situação que contém “uma fonte de energia ou de fatores fisiológicos e de comportamento/ conduta que, quando não controlados, conduzem a eventos/ocorrências prejudiciais/nociva” (shinar, Gurion e Flasher, 1991, p. 1095, apud Grimaldi e Simonds, 1984, p. 236)

Fonte: Fischer et al, (2002)

Assim, torna-se possível e sensato concluir, no que tange a produtos químicos, que o perigo é determinado levando-se em consideração as características intrínsecas daqueles, ou seja, o perigo é inerente à composição molecular. Pode-se considerar o risco como um efeito do perigo ponderado com outro fator.

 

6. ANÁLISE DA EXISTÊNCIA DE COERÊNCIA/INCOERÊNCIA DADA PELA CLASSIFICAÇÃO APLICADA AO TRANSPORTE DE PRODUTOS PERIGOSOS E AO GHS

Para fins do escopo do GHS, a classificação refere-se, coerentemente, aos perigos das substâncias, haja vista que o objetivo é classificá-las de acordo com suas características intrínsecas, e não associá-las a uma determinada atividade na qual podem estar envolvidas.

Já para fins de transporte, a classificação é dada em função do perigo associado à substância, ponderado com as atividades englobadas em uma operação de movimentação dela. Assim, conclui-se:

Perigo X Transporte = Risco associado ao Transporte.

Também é importante compreender que, para fins de transporte, a alocação em classes de risco se dá em função do único risco físico presente, ou do mais sério, no caso de haver riscos múltiplos. Para fins do GHS, devem ser apresentados os perigos correspondentes aos perigos físicos nos mesmos moldes do utilizados na classificação para transporte, também os perigos à saúde e ao meio ambiente.

A Tabela 3 dispõe o que é avaliado para fins de transporte e para fins do GHS.

  GHS Transporte de Produtos Perigoso
Base da Classificação Perigos físicos Perigos físicos - químicos ponderados com a atividade de transporte
Perigos a saúde
Perigos ao ambiente
Resultado Classe de Perigo Classe de Risco

 

Essa análise é fundamental para a compreensão dos motivos pelos quais o GHS se refere a classes de perigo, enquanto a regulamentação de transporte se refere a classes de risco. Também, para entender-se por que classificações diferentes pelos citados sistema dados para um mesmo produto ou substância não apresentam incoerência.

Como exemplos, apresentam-se a seguir alguns casos concretos.

Para fins do escopo do GHS, os líquidos serão considerados como inflamáveis em função de seu ponto de fulgor, que vem a ser a menor temperatura na qual um líquido combustível ou inflamável desprende vapores em quantidade suficiente para que a mistura vapor-ar, logo acima de sua superfície, propague uma chama a partir de uma fonte de ignição.

Neste sentido, o GHS classifica um produto como líquido inflamável em quatro categorias, a saber:

TABELA 4: Categorias de Classificação de Líquidos Inflamáveis segundo o GHS

Categoria Critério
1 Ponto de fulgor <23ºC e temperatura inicial de ebulição ≤ 35ºC
2 Ponto de fulgor <23ºC e temperatura inicial de ebulição > 35ºC
3 Ponto de fulgor ≥ 23ºC ≤ 60ºC
4 Ponto de fulgor > 60ºC ≤ 93ºC

Fonte: GHS (2005)

Para fins de transporte, líquidos inflamáveis são considerados perigosos somente se apresentam ponto de fulgor de até 60,5ºC, em ensaio de vaso fechado, ou até 65,6ºC, em ensaio de vaso aberto. Todavia, caso apresentem ponto de fulgor maior do que 35ºC, mas não mantenham a combustão, esses líquidos não precisam ser considerados inflamáveis para fins de transporte. (Resolução ANTT nº. 420/04)

Assim, levando-se em conta a ressalva realizada pela legislação de transporte, entende-se não haver incoerência no caso de certo líquido poder ser classificado como inflamável nos termos do GHS e não inflamável para transporte.

Cabe analisar também a questão dos riscos à saúde e ao meio ambiente, que são considerados para que se proceda à classificação de acordo com o GHS. Certos produtos podem apresentar não só perigos à saúde, como irritação da pele e dos olhos, como também perigo ao meio ambiente, como toxicidade aquática, sem ser, por tais motivos, perigosos para o transporte.

Por último, mas não encerrando o rol de possibilidades, cabe apontar o caso de um produto apresentar perigo físico e perigo à saúde em termos do GHS, mas somente o perigo físico é considerado em termos de transporte.

Entende-se, então, que tais situações e outras semelhantes virão a acontecer quando da implementação do GHS no país, mas não se apresentam como incoerentes. Entretanto, os pontos cruciais são analisar como ambos os sistemas se apresentarão em termos visuais (comunicação dos riscos por meio de pictogramas) e esclarecer aos expedidores, aos fabricantes, aos transportadores de produtos perigosos, à fiscalização rodoviária e ao mercado consumidor de produtos químicos e perigosos o objetivo de cada um dos sistemas e a coerência entre eles

 

7. SINALIZAÇÃO DE PERIGOS E RISCOS PARA FINS DO GHS E DO TRANSPORTE, RESPECTIVAMENTE

Tratando-se de produtos químicos e perigosos, é importante que a identificação, seja pelo usuário, seja equipe de atendimento a emergências, possa ser realizada da maneira mais rápida e eficiente possível, haja vista a necessidade de fácil entendimento dos riscos associados e da possível necessidade de pronta assistência emergencial. Faz-se uso, então, da pictografia.

Pictografia é a forma de escrita pela qual idéias são transmitidas por desenhos. Um pictograma (do latim picto -pintado + grego graphe -caracter, letra) é, pois, um símbolo que representa um objeto ou conceito por meio de ilustrações. Complementarmente, o GHS define pictogramas como uma composição gráfica que inclui um símbolo e outros sinais gráficos como borda, padrão ou cor de fundo definidos com o objetivo de transmissão de dada informação.

A Tabela 5 apresenta os símbolos de perigo e respectivos pictogramas que serão utilizados para o GHS e também alguns dos pictogramas utilizados no transporte. Com exceção dos últimos três apresentados, todos os demais têm como referência alguns dos presentes na legislação de transporte.

TABELA 5: Símbolos e pictogramas a serem utilizados pelo GHS e alguns dos pictogramas de transporte

 

Diante da Tabela 5, torna-se simples perceber que, ao utilizar somente um símbolo - por exemplo, de inflamável para vários tipos de substâncias, como líquidos, sólidos, substâncias sujeitas à combustão espontânea - o GHS realmente explora somente a característica química, propriedade intrínseca da substância. Ele não pode ser utilizado para o transporte, pois a função do pictograma na face externa do caminhão e nas embalagens externas destinadas ao transporte, além de servir para alertar o usuário sobre o carregamento, é orientar a equipe de atendimento a emergências sobre o real conteúdo da carga, a fim de possibilitar um rápido e eficaz atendimento.

Cabe analisar, por fim, o resultado que ambas as classificações e ambos os sistemas de utilização de pictogramas ocasionarão nas embalagens destinadas ao consumidor e nas destinadas ao transporte.

A figura 1 representa o caso mais simples e menos provável de geração de dúvida. Não só para o GHS como também para o transporte, o produto é classificado somente como inflamável. Assim, o símbolo a ser utilizado nos pictogramas, tanto na embalagem interna (destinada ao usuário) quanto na embalagem externa (destinada ao transporte), será o mesmo.

FIGURA 1: Embalagem interna e embalagem externa identificadas com os mesmos símbolos Fonte: GHS (2005)

Também, pode ocorrer que o produto a ser transportado apresente, além de perigo físico-químico, perigo à saúde nos termos do GHS e esta característica não seja considerada geradora de risco para o transporte. A figura 2 apresenta um produto classificado como inflamável e carcinogênico de acordo com o GHS. No entanto, para fins de transporte, o único perigo considerado gerador de risco é o de inflamabilidade, enquadrado na classe de risco correspondente aos inflamáveis. Assim, na embalagem interna, os pictogramas são formados utilizando-se os símbolos de inflamável e o de carcinogenicidade, enquanto na embalagem destinada ao transporte, apresenta-se somente o pictograma gerado com o símbolo de inflamável.

FIGURA 2: embalagem interna identificada com um símbolo a mais do que a embalagem externa
Fonte: GHS (2005)

Finalmente, cabe analisar outra situação possível, porém lembrando que as possibilidades não se limitam às apresentadas. A figura 3 representa um produto que, de acordo com o GHS, é considerado somente irritante aos olhos, o que requer que seja ele marcado com pictograma contendo o ponto de exclamação. Para o transporte, tal perigo não agrega risco à atividade e não é considerado perigoso. Assim, a embalagem externa não deve apresentar nenhum tipo de pictograma.

FIGURA 3: Somente embalagem interna identificada com símbolo de perigo Fonte: GHS (2005)

 

8. ESCLARECIMENTOS A SEREM REALIZADOS AOS ENVOLVIDOS DA CADEIA DE TRANSPORTE

O ponto central é o esclarecimento dos envolvidos na cadeia de transporte de produtos perigosos, o que abrange desde os fabricantes de produtos químicos até os agentes fiscalizadores.

Aos fabricantes e expedidores caberá o esclarecimento principalmente no que diz respeito a diferentes escopos e objetivos das duas classificações; diferença entre o conceito de risco e de perigo; características dos produtos a serem levados em conta para proceder-se às classificações; utilização correta dos pictogramas nas embalagens internas e externas.

No que tange aos transportadores, cabe esclarecer primordialmente a razão da ausência de incoerência, caso seja corretamente oferecido para transporte um produto portando pictogramas de risco nos termos do GHS, mas que não é considerado perigoso para transporte; assim, tal expedição não necessita dos documentos específicos, sinalizações e outras exigências cabíveis caso o produto fosse considerado perigoso.

Por último, cabe esclarecer os agentes fiscalizadores no mesmo sentido das figuras expostas acima, a fim de que sejam evitadas aplicações indevidas de infrações devido, principalmente, à observância de símbolos já conhecidos em pictogramas de embalagens de produtos perigosos em carga não classificada como perigosa para transporte, e também o contrário, isto é, a presença de símbolos de risco à saúde, que não é por eles conhecido de acordo com o transporte. Ambos os pontos tratam, na verdade, do esclarecimento do real escopo de aplicabilidade de cada uma das classificações.

 

9. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conclui-se que a implementação do GHS no Brasil acompanha a tendência global e é imprescindível tanto para manutenção do país no mercado internacional como para agregar confiabilidade ao consumidor e usuário no que diz respeito às informações prestadas pelos fabricantes.

Como a legislação aplicável ao transporte de produtos perigosos já se encontra consolidada e amplamente divulgada entre os envolvidos, é importante que tais normas, ao tratarem de assuntos correlatos, não pareçam incoerentes. Em verdade, elas se complementam.

O entendimento de ambos os sistemas por parte da cadeia de transporte e dos consumidores de produtos químicos e perigosos auxilia o país em seu desenvolvimento econômico, além de colocá-lo no mesmo patamar dos países desenvolvidos no que diz respeito a esclarecimento e presteza nas informações disponíveis à população.

 

10. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Alves, P.; Gontijo, G.; Junior, A. Análise do transporte rodoviário de produtos perigosos no estado de São Paulo suas conseqüências no meio ambiente. Disponível em <http://www.ambiente-augm.ufscar.br/uploads/A3-038.pdf>, acessado em 17 de março de 2010

Fischer, D; Guimarães, L.; Schaeffer, C., Percepção de risco e perigo: um estudo qualitativo no setor de energia elétrica, UFRGS/PPGEP, Porto Alegre, 2002

GHS, Globally Harmonized System of Classification and Labelling of Chemicals, United Nations, Revisão 1, New York e Genebra, 2005.

MDIC, Termo de Referência, 2009. GT-GHS-Brasil, Disponível em http://www.desenvolvimento.gov.br/sitio/interna/interna.php?area=5&menu=787, acessado em 17 de março de 2010

Real, M. A informação como fator de controle de risco no transporte rodoviário de produtos perigosos, Tese de Mestrado, UFRJ/COPPE/PET, Rio de Janeiro, 2000

Resolução ANTT nº. 420 de 12 de Fevereiro de 2004

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